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Mário de Pinna e Nahor Neves debatem o evolucionismo



Debate sobre o evolucionismo, transmitido pela SescTV, entre os professores Mário César Cardoso de Pinna (evolucionista) e Nahor Neves de Souza Jr. (criacionista). O vídeo acima é uma lista de reprodução para o programa completo, não é necessário procurar por outras partes no YouTube.

Confira todos os erros cometidos por Nahor Neves de Souza Júnior nos típicos erros criacionistas.

Novvs Orbis

Ao longodos seus 183 anos a Biblioteca do Senado Federal esteve envolvida nos acontecimentos marcantes que compõem a história política do país. Neste ano se iniciou um processo de digitalização das obras raras do acervo. A Biblioteca do Senado passa agora a integrar a Online Computer Library Center (OCLC) e como bônus nos oferece 77 obras digitalizadas. Consulte o site http://www2.senado.gov.br/bdsf/
Para marcar o início da digitalização foi lançado um DVD com o conteúdo integral, inclusive com animações, do livro Novvs Orbis, de Joanne de Laert Antverp, publicado em 1633, reunindo informações geográficas, etnográficas e históricas da América, extraídas de trabalhos de botânicos e cartógrafos holandeses. O DVD é distribuído gratuitamente na Biblioteca do Senado, mas corram que a edição é limitada. Já peguei o meu e garanto que é fantástico.
Acioli

Marina e o Evolucionismo

Vendo o video da ex-ministra Marina aqui no blog, veio-me à mente um post colocado em janeiro de 2008 no blog Central Desinformativa, que, infelizmente, deixou de existir. Apesar do tom satírico é muito sério. Reflitam.

Em tom de sarcasmo e prepotência, anônimos escrevem para este blógue reivindicando que eu escreva sobre a participação da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, em um evento criacionista bancado pela igreja adventista. Insinuam, me parece, que a palestra intitulada “Preservando as obras do Criador no Brasil” deva ser motivo de crítica. A ciência, por acaso, conseguiu provar que o mundo não é obra do Todo Poderoso?

Alguém poderia, no entanto, argumentar que o ambientalismo não deve ser fonte de preocupação para os cristãos. Se nosso Pai criou toda a biodiversidade do mundo em sete dias, certamente não seria incômodo criar a Amazônia de novo se por ventura nós queimarmos a mata inteira sem querer. Por essa lógica, os darwinistas —defensores de uma teoria cheia de insuficiências epistêmicas— é que deveriam estar preocupados, já que na cabeça deles a evolução demorou 3,8 bilhões de anos para construir tudo isso, por meio do simples acaso.

Mas mesmo que a teoria da evolução esteja correta, qual é o problema de uma ministra fazer um pequeno flerte com a pseudociência? Só porque o ministério diz pautar suas ações em dados científicos objetivos? Se os biólogos que trabalham no Ibama acreditam em evolução e em ciência, o problema é deles. Eu me pergunto: por que quem lida com estudo e proteção da biodiversidade tem necessariamente que acreditar em biologia? Acreditar em ciência? É perfeitamente possível, por exemplo, usar computador sem acreditar em matemática.
Um notório engenheiro eletrônico brasileiro costuma dizer por aí: “se você não gosta de matemática, não deveria usar nem telefone celular”.

É um exagero, claro. Nós sabemos que Prodes e o Deter (do INPE) só usam satélites sofisticados por questão de conveniência. É perfeitamente possível usar videntes e paranormais para monitorar o desmatamento. Por que tanto desprezo pela religião e pela espiritualidade? Se o plano da ministra der errado, não seria má idéia, afinal, trocar toda essa parafernália por uma capelinha, um lugar onde se possa ajoelhar e rezar para a Amazônia não acabar.

Os humanos ainda estão evoluindo? Com certeza!

Pare um pouco. Não vá com tanta sede ao pote. Antes de continuar, pergunte a você mesmo: o que é “evolução” na ciência? O que significa dizer que os humanos ainda estão evoluindo? É que as pessoas estão ficando melhores, mais inteligentes, mais astutas, menos tolas ao votar nos senadores? Nada disso. Evolução não é melhoria. Evolução não é progresso. Para ser mais exato, na verdade evolução pode ser melhoria e progresso, mas não é. Confuso?

O caso é que melhoria e progresso são conceitos bastante frouxos e relativos, e só por isso já não servem para a ciência. São conceitos ligados ao modo como enxergamos o que é bom e o que é ruim, e como bem sabemos, o lixo de alguém pode ser o luxo de outra pessoa, e existem na história da filosofia diversas formas de enxergar a moral. Em geral os filósofos dedicam seu pensamento nessa questão a uma área de investigação filosófica chamada Ética ou Filosofia Moral. Pergunte a um filósofo o que é bem e mal (e melhoria nada mais é que o avanço do bem sobre o mal), e você provavelmente receberá outras perguntas como resposta: “Depende. De acordo com Platão? Ou Epicuro, ou Spinoza, ou Kant… (etc. etc.)?”

Em poucas palavras, melhoria e progresso são objeto de estudo da filosofia, não da ciência.

Evolução, do latim evolvere (desdobrar-se), não é nada disso na biologia. Mark Ridley a define no glossário do livro Evolução:

Darwin definiu-a como “a descendência com modificações”. É a mudança, entre as gerações, nas linhagens das populações. [Ênfase acrescentada.]

Você não vai encontrar a palavra “evolução” em nenhum lugar do livro Da origem das espécies de Charles Darwin. O que ele chamava de “descendência com modificação” é, portanto, o que chamamos hoje de evolução, como Ridley lembra. Evolução é mudança, modificação, causada principalmente pela seleção natural (a sobrevivência não aleatória de variedades que surgem casualmente). E como as características dos seres vivos estão fundamentadas principalmente nos genes, evolução então é a mudança nos genes? Não exatamente. Mudança nos genes por si só é mutação. Evolução seria então a diferença na persistência de mutações diferentes, ou variedades diferentes de genes, ao longo das gerações.

Como existem mutações favoráveis para a sobrevivência (como a mutação de uma família de italianos que evita que o colesterol se acumule em suas artérias) e mutações desfavoráveis para a sobrevivência (como as que causam os fetos anencéfalos), necessariamente nem todas as variedades de genes persistem com o passar das gerações. As frequências (ou seja, porcentagens) dos genes mudam. Existem técnicas genéticas para detectar se a evolução está acontecendo.

Voltemos então à pergunta: os humanos ainda estão evoluindo? As linhagens das populações humanas estão se modificando? A frequência dos genes humanos está mudando?

Stephen Stearns, um biólogo da Universidade de Yale, se juntou a outros cientistas para responder a esta pergunta. Seus resultados foram publicados pela revista científica PNAS, e dizem sim.

O estudo mostra que, por mais que a Medicina trabalhe para amenizar o resultado das mutações desfavoráveis, o Homo sapiens está sim evoluindo e sendo moldado pela seleção natural, talvez até nas mesmas taxas evolutivas de outros seres vivos.

ResearchBlogging.orgOs pesquisadores analisaram características importantes para a saúde humana em dados de uma pesquisa realizada durante 60 anos com 2000 mulheres dos Estados Unidos, e descobriram, através do número de filhos de cada uma das mulheres, que a diferença neste número mostra que a seleção natural está favorecendo mulheres um pouco mais baixas, mais gordinhas, com menores níveis de pressão sanguínea e colesterol, que têm filhos quando estão mais novas, e que atingem a menopausa mais tarde.

Em suma, a evolução está acontecendo nos humanos, e, segundo o estudo, em taxas que são de médias a baixas, o que só corrobora resultados anteriores em outras áreas como a genética molecular.

Agora discuta com seus amigos: isso é melhoria? Depende, diz o filósofo: você gosta de mulheres baixinhas e cheinhas?

(Lembrando que se a seleção natural persistir neste caminho nos Estados Unidos, não significa que esteja na mesma rota no resto do mundo. Como todo biólogo sabe, é o meio-ambiente que determina para onde vai a seleção natural.)

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Referências

Ridley, M. Evolução. Artmed, 2006.

Byars, S., Ewbank, D., Govindaraju, D., & Stearns, S. (2009). Natural selection in a contemporary human population. Proceedings of the National Academy of Sciences, 106 (42) : doi: 10.1073_pnas.0906199106

Créditos das imagens
– Feto: NEIL BROMHALL / SCIENCE PHOTO LIBRARY
– Evolução humana: BILL SANDERSON / SCIENCE PHOTO LIBRARY

Aquecimento global: salve-se quem puder!

Eu estava comendo um lanche com um amigo aqui em Brasília esta semana, e ele comentou comigo como está estranha essa invasão de pequenos besouros na cidade. Estamos começando a estação chuvosa do Cerrado, então é comum que os insetos pululem ao nosso redor numa algaravia intensa de sexo e morte.

Mas para nós dois parece que algo está diferente. Ou há mais insetos que o normal, ou a composição dos tipos de insetos que ficam rodopiando em volta das luzes da cidade está diferente. Qual é a causa? Aventamos a hipótese de que o aquecimento global tem algo a ver com isso. Mas somos apenas dois demagogos comendo sanduíche numa loja de conveniência, não fizemos experimento nenhum, então nada (além de algum valor intuitivo de plausibilidade) podemos oferecer para amparar nossas explicações preguiçosas. Mas nada mesmo? Enquanto estapeamos os besouros que ficam pousando em nossas cabeças, chineses botam a mão na massa.

Na semana passada, a revista científica Nature noticiou que cientistas chineses, após analisar mais de mil anos de registros históricos (MIL anos!), concluíram que explosões populacionais de gafanhotos têm maior probabilidade de acontecer quando o clima está mais quente e mais seco.

ResearchBlogging.orgO motivo de os chineses estarem registrando esses dados há tanto tempo, além do óbvio fato de a China ser uma civilização letrada há milhares de anos, é que esses enxames de gafanhotos causam diversas perdas para os humanos, destruindo as plantações. Na verdade, os registros chineses de tais nuvens de gafanhotos remontam até a datas superiores a dois mil anos atrás.

Ge Quansheng, envolvido no estudo e diretor do Instituto de Pesquisas em Ciências Geográficas e Recursos Naturais da Academia Chinesa de Ciências, disse à Nature que “os resultados são um alarme para mais uma consequência séria das mudanças climáticas”.

Muitos gafanhotos, muitos besouros… muitos gafanhotos e besouros se reproduzindo… muitos gafanhotos e besouros morrendo. O que isso lembra?

Lembra as premissas que Charles Darwin usou para concluir que o mecanismo por trás da mudança evolutiva é a seleção natural.

O aquecimento global antropogênico já é uma fonte de seleção natural (ou pressão seletiva, como costumam chamar os biólogos evolutivos) nas espécies do planeta. Quando seu hábitat está ficando insuportável, existem três “saídas”: extinção, adaptação às novas condições ou o bom e velho “salve-se quem puder”, a migração. (As três coisas podem acontecer concomitantemente à seleção natural.)

Migração significa que a distribuição de várias espécies pode mudar no futuro do planeta, como estima a pesquisa de William Cheung e colaboradores, publicada este mês na revista científica Global Change Biology.

A equipe de Cheung calculou o que acontecerá com 1066 espécies marinhas que são alvos da pesca comercial (vertebrados e invertebrados), a fonte de alimentação de muita gente. A conclusão dos cientistas é que o potencial de captura desses frutos do mar crescerá de 30 a 70% em altas latitudes, mas cairá 40% nas regiões dos trópicos até o ano de 2055. Isso significa milionários da indústria da pesca em países como Noruega e Rússia, e grandes problemas para os pescadores do Brasil e da África.

Enquanto isso, Richard Kerr, na revista Science, relata que pesquisas mostram que o aquecimento se manteve estável nos últimos dez anos. Porém, isso pode ser mais o barulho de um pavio se encurtando do que um motivo para refrescarmos a cuca. Apesar de toda a festa dos negacionistas do aquecimento global antropogênico, as simulações dos cientistas já esperavam que num quadro de aquecimento acontecessem pausas de estabilidade como a da última década. A perspectiva para o século XXI continua sendo de aumento de pelo menos 2°C na média da temperatura global.

Eu disse 2°C? Novos estudos científicos indicam que pode aumentar ainda mais, até 4°C em 2060 ou 2070.

Os últimos 10 anos podem ter indicado que não foi tão ruim assim o saldo da flatulenta insistência humana em emitir gases de efeito estufa, quando somada a outros efeitos climáticos como La Niña e El Niño. Mas a perspectiva de especialistas, reunidos este mês na Universidade de Oxford, é pessimista.

Os modelos para o aumento de 4°C incluem grandes declínios (de até 20%) no regime de chuvas na África, na Austrália, no Mediterrâneo e na América Central, o que pode significar mais fome no mundo.

Uma das pesquisas tratadas no encontro, de Richard Betts, prevê que 4°C de aumento no mundo significam até 10°C a mais em regiões como a África ocidental e meridional, e o mesmo ou ainda mais no Ártico.

Outro estudo apresentado em Oxford, de Nigel Arnell, faz cálculos para o que pode acontecer até 2080 se as emissões de gás carbônico não sofrerem cortes dramáticos: 1 bilhão de pessoas sofrerão por causa da força da água, metade delas em áreas propensas a inundações; as lavouras mudarão intensamente, com possíveis quedas em produções como a soja; até 15% da terra cultivável atual se tornará infértil, embora as terras aquecidas em locais antes frios podem representar 20% a mais de terra fértil; e a cobertura da Amazônia sofrerá uma retração significativa.

Quais são as soluções? Existem as soluções arriscadas e malucas, e as soluções simples.

Uma solução arriscada e maluca é imitar o que já aconteceu na história registrada durante erupções de vulcões: emissão de gases aerossóis (como gases compostos por enxofre) na atmosfera, para que eles diminuam as temperaturas. Poderia ser usado numa emergência global, mas os custos são altos e os riscos também, como indica um artigo científico de Alan Robock e colaboradores relatado em Nature Reports Climate Change . Os riscos incluem dificultar o fechamento do buraco na camada de ozônio sobre a Antártida, secas regionais, acidificação dos oceanos (que destrói os corais), redução na quantidade de luz solar que recebemos e – pasme! – o fim da cor azul do céu. Os autores concluem que esta “geoengenharia” será usada apenas na medida em que os danos provocados pelo aquecimento forem grandes demais.

A solução simples continua sendo uma dramática diminuição na emissão de gás carbônico, e nisso cada um dos bilhões de seres humanos neste planeta pode contribuir.

Ou vamos deixar que nossa irracionalidade nos jogue novamente nas presas sangrentas da seleção natural? Vamos agir como os besourinhos de Brasília em torno das lâmpadas, hipnotizados pelos prazeres do consumo irresponsável, sem olhar o que está acontecendo em volta e sendo esmagados pelas circunstâncias?

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Referências:

Qiu, J. (2009). Global warming may worsen locust swarms Nature DOI: 10.1038/news.2009.978

CHEUNG, W., LAM, V., SARMIENTO, J., KEARNEY, K., WATSON, R., ZELLER, D., & PAULY, D. (2009). Large-scale redistribution of maximum fisheries catch potential in the global ocean under climate change Global Change Biology DOI: 10.1111/j.1365-2486.2009.01995.x

Kerr, R. (2009). What Happened to Global Warming? Scientists Say Just Wait a Bit Science, 326 (5949), 28-29 DOI: 10.1126/science.326_28a

Barnett, A. (2009). No easy way out Nature Reports Climate Change (0911) DOI: 10.1038/climate.2009.106

Heffernan, O. (2009). Risky business Nature Reports Climate Change (0911) DOI: 10.1038/climate.2009.105
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Créditos das imagens
Nuvem de gafanhotos: KAZUYOSHI NOMACHI / SCIENCE PHOTO LIBRARY
Gráfico mostrando a estabilidade do aquecimento nos últimos 10 anos: Adaptado de J. KNIGHT ET AL., BULL. AMER. METEOR. SOC., 90 (SUPPL.), S22–S23 (AUGUST 2009)

BLOG ACTION DAY

TV Cultura lança programa “Evolução – a festa da vida”

Nova série Videociência aos sábados, às 18h, na TV Cultura, aborda a evolução biológica.

A partir de 24 de outubro, a TV Cultura exibe aos sábados, das 18 às 19h, a série “Evolução, a Festa da Vida”, de seis episódios sobre a teoria da evolução e seus impactos no nosso dia-a-dia. Desenvolvida pela Video Ciência Produções em parceria com a Escola SESC de Ensino Médio e apoio do Projeto Ver Ciência, a nova série tem formato de talk show, com platéia de 40 jovens de todo o Brasil (alunos da Escola SESC Ensino Médio), cientistas convidados da USP e da UFRJ e várias bandas que animam a galera e dão o clima festivo dos programas.

Os programas têm apresentação dos jornalistas Vinícius Canisso e Bruna Aucar e participação especial do Professor Nelio Bizzo, da USP, especialista no tema evolução e coordenador científico da série, que apresenta e entrevista outros cientistas convidados, da USP e da UFRJ. A direção geral é do jornalista científico Sergio Brandão, diretor da produtora independente Videociência e curador internacional das mostras Ver Ciência, um apaixonado pelo tema da teoria da evolução.

“Evolução, a Festa da Vida” terá pré-estreia para imprensa e convidados no dia 16 de outubro em Jacarepaguá.

O primeiro programa, “Antes e Depois de Darwin”, mostra a passagem marcante do cientista pelo Brasil, em 1832, com apenas 23 anos de idade. A Profa. Maria Isabel Landim, do Museu de Zoologia da USP, explica por que o mundo tem motivos de sobra para celebrar a fabulosa contribuição do naturalista britânico ao avanço do conhecimento.

O segundo, “Quanto Tempo Leva a Evolução? / Darwin e o Tempo Geológico” aborda as contribuições da Geologia e da Paleontologia para a compreensão do desenvolvimento da teoria evolutiva de Darwin.

O terceiro, “O que é Seleção Natural?” analisa as questões relativas à diversidade biológica, à reprodução dos seres vivos e à competição entre indivíduos da mesma espécie.

O quarto, “O que Darwin não conhecia? / Genética e DNA” explica como Darwin concebeu sua teoria da evolução por seleção natural sem mencionar os mecanismos modernos da hereditariedade e da origem da variabilidade entre indivíduos da mesma espécie.

O quinto, “Por Que Somos Como Somos / Darwin e a Psicologia” nos ajuda a compreender o comportamento humano e explica em que aspectos ele é semelhante e diferente ao dos animais. Ou melhor: em que medida há uma base biológica para esta explicação.

O sexto e último programa, “Aplicações da Teoria da Evolução / Para Onde Vamos?”, explora as aplicações e implicações da teoria da evolução em diversas áreas, como na medicina, na agropecuária, na proteção ao meio ambiente e até na ciência de computação.

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E-mails para o programa: festadavida@verciencia.com.br

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EVOLUÇÃO, A FESTA DA VIDA

Direção Geral: Sérgio M.C. Brandão / Produção: Videociência

Programa 1 – “Antes e Depois de Darwin” – 24 de outubro, 18h
Programa 2 – “ Quanto tempo leva a Evolução? / Darwin e o Tempo Geológico” -31 de outubro, 18h
Programa 3 – “O que é Seleção Natural” – 7 de novembro, 18h
Programa 4 – “O que Darwin não conhecia / Genética e DNA” – 14 de novembro, 18h
Programa 5 -“Por Que Somos como Somos (Darwin e a Psicologia) – 21 de novembro, 18h
Programa 6 – “Aplicações da Teoria da Evolução / Para onde vamos” – 28 de novembro, 18h

Nossas células e nossa origem

A menor unidade da vida é a célula. Todas as funções e características dos seres vivos dependem das células que os constituem, pois as células são as unidades morfológicas e fisiológicas de todos os organismos vivos no planeta. Células originam outras células e podem tanto ter vida livre (como muitas bactérias), ou, quando se associar, formar colônias e até organismos multicelulares (como é o caso dos seres humanos).

É possível dividir as células em dois grandes grupos: o grupo das células procarióticas e o grupo das células eucarióticas. A origem dos termos é grega; o termo “pro” significa primeiro (ou anterior) e o termo “eu” significa verdadeiro. Já “cario” vem do grego karyon, termo que faz referencia a “núcleo”. Logo, procariontes são células que não possuem um núcleo verdadeiro – ou seja – um núcleo bem definido e revestido por membrana, mas elas costumam apresentar uma região normalmente central, conhecida como nucleóide, onde se encontra o material genético. O nucleóide das células procarióticas é anterior ao núcleo das células eucarióticas, surgindo primeiro na história evolutiva das células. Em células eucarióticas (eucariontes) o material genético encontra-se em um envoltório nuclear membranoso denominado carioteca.

Contudo, essas não são as únicas diferenças entre esses dois grandes grupos de células. Existem várias outras características que podem diferenciar células eucarióticas de células procarióticas. Células eucarióticas, por exemplo, possuem – em seu citoplasma – diversas organelas membranosas responsáveis por diversas atividades fisiológicas fundamentais dos eucariontes. Estas organelas membranosas citoplasmáticas estão ausentes em células procarióticas. Outro exemplo de estrutura celular exclusiva de células eucarióticas é o citoesqueleto. O citoesqueleto corresponde a uma serie de microfilamentos protéicos responsáveis pela integridade estrutural, aquisição da forma, pelo transporte das já citadas organelas e, muitas vezes, pelo movimento celular de seres eucariontes. Enfim, várias outras diferenças podem ser mencionadas aqui, mas esta abordagem mais aprofundada não é o objetivo do presente artigo.

Talvez, um dos fenômenos mais importantes na história da vida na Terra tenha sido o surgimento das células eucarióticas, pois elas possibilitaram que os organismos vivos adquirissem maior complexidade ao longo da evolução, com isso, novas funções, interações e adaptações puderam ser desenvolvidas pelas formas de vida até então existentes.

Origem primitiva da linhagem das mitocôndrias e dos cloroplastos


Segundo a teoria cientifica mais aceita atualmente, as mitocôndrias e os cloroplastos, duas organelas celulares que hoje conhecemos, surgiram por eventos de simbiogênese entre células hospedeiras e procariontes. A Simbiogênese é definida como o surgimento de uma nova classe de organismos como resultado de uma associação simbiótica favorável. Porém a história das mitocôndrias e cloroplastos começa muito antes disso.

Acredita-se que os primeiros organismos vivos a surgir foram procariontes anaeróbios (há 3,5 bilhões de anos). Esses organismos unicelulares realizam um processo denominado fermentação para conseguir sua energia essencial. A fermentação é um processo ineficiente no que diz respeito ao saldo energético resultante. Porém, provavelmente, demorou mais algumas centenas de milhões de anos para que a vida desse o próximo passo, resultando em uma forma mais eficiente de adquirir energia. Esse ‘próximo passo’ reflete-se no surgimento de uma molécula funcional chamada clorofila. A clorofila é capaz de canalizar a energia da luz solar em energia química através do processo de fotossíntese. Com isso, alguns tipos de células passaram a tirar proveito dessa vantagem energética. Surgiram, assim, os procariontes fotossintetizantes. A fotossíntese também é um processo produtor de oxigênio (O2), dessa forma, tais células liberavam esse gás no ambiente.

O surgimento dos seres fotossintetizantes alterou completamente a atmosfera da Terra primitiva, gerando uma grande revolução na historia do planeta e redirecionando a evolução dos organismos vivos. O O2 liberado para a atmosfera foi se acumulando pouco a pouco com o passar dos milhões de anos. Em algum momento a concentração de O2 atmosférico se tornou favorável ao surgimento da respiração aeróbia (uma nova e vantajosa maneira de obtenção energética) e assim originou-se a linhagem de organismos que hoje conhecemos como procariontes aeróbios.

Nessa época, provavelmente, os ancestrais da linhagem que mais tarde originariam as mitocôndrias e cloroplastos surgiram.

Contudo, a respiração não foi à única vantagem que o oxigênio possibilitou para a vida na Terra. O acumulo de oxigênio na atmosfera possibilitou o surgimento de uma camada protetora na estratosfera terrestre. Esta é a famosa Camada de Ozônio, que protege os seres vivos contra as radiações ultravioleta, emitidas pelo Sol. Talvez o surgimento dessa barreira protetora tenha ajudado as formas de vida a se desenvolver e ocupar novos ambientes ao redor da Terra.

Origem das organelas membranosas e do envoltório nuclear

A hipótese mais aceita para o surgimento das organelas membranosas de células eucarióticas (com exceção das mitocôndrias e cloroplastos) é que a partir de mutação genética e seleção não aleatória de caracteres (e aqui entra a evolução por seleção natural), alguns procariontes teriam começado a sintetizar novos tipos de proteínas. Esse processo acarretou no surgimento do citoesqueleto celular que, como já comentado, traz várias vantagens adaptativas para a célula e, neste caso, não foi diferente. O citoesqueleto possibilitou as células realizarem movimentos de envaginação (projeção da membrana celular para fora da célula) e ivaginação (dobras da membrana celular para o interior da célula). Assim, supõe-se, a partir de evidencias que serão mostradas neste artigo, que as organelas membranosas surgiram a partir de invaginações favoráveis nas celulas – criando diversos centros funcionais especializados em diferentes atividades metabólicas – que hoje conhecemos como organelas celulares. Organelas como os lisossomos e o aparelho de Golgi teriam surgido dessa maneira. Esse mesmo processo foi responssavel pelo surgimento do envoltório nuclear (principal característica das células eucarióticas) que envolve e protege o material genético.

A Teoria da Endossimbiose

Evidências indicam que as mitocôndrias e os cloroplastos não tiveram a mesma origem das demais organelas membranosas de células eucarióticas, como já foi mencionado. Segundo a teoria da endossimbiose, proposta por Lynn Margulis, essas duas organelas surgiram a partir de interações mutuamente vantajosas entre organismos distintos.

Com o advento do citoesqueleto, os movimentos celulares possibilitaram o fenômeno da fagocitose. Na fagocitose o alimento é englobado por envaginações da membrana celular e a partícula englobada é então levada até o citoplasma e digerida. Possivelmente esse fenômeno ocorrera de forma que células procariontes englobadas não foram digeridas pelo fagócito (célula capaz de realizar a fagocitose), mas passaram a viver no interior dele em uma relação mutualistica – interação benéfica para ambos os organismos.

Procariontes aeróbios (os endossimbiontes) beneficiavam-se de proteção, ambiente favorável e nutrição necessária para suas atividades enquanto forneciam energia extra para a célula eucariótica maior (célula hospedeira). Isso teria originado as “protomitocôndrias”.

Fenômeno parecido deve ter ocorrido para dar origem aos cloroplastos, mas, no caso desses, as células englobadas foram procariontes fotossintetizantes que forneciam energia, originária da luz solar, às células hospedeiras.

Assim, células procariontes teriam passado a viver no interior de células eucariontes primevas, em simbiose. Essa simbiose seria bastante vantajosa para ambos os organismos, de modo que passaram a existir em co-evolução.

Com a endosibiose, genes do endossimbionte foram transferidos para o organismo hospedeiro como conta a Bióloga Sônia Lopez, em texto adaptado do livro Biologia Molecular e Evolução:

“Uma vez ocorrida a endossimbiose, genes do endossimbionte podem ser transferidos lateralmente para o núcleo da célula hospedeira. Os produtos desses genes devem ser então direcionados às organelas. Mitocôndrias e cloroplastos são, portanto, semi-independentes, já que necessitam dos produtos de alguns genes que agora são codificados no núcleo. Em alguns complexos enzimáticos, uma parte das subunidades é codificada pelo genoma nuclear e uma parte pelo genoma da organela. Transferências de genes entre mitocôndrias e cloroplastos também podem ter ocorrido. A transferência específica de genes entre os compartimentos celulares varia nos diferentes organismos. O mecanismo pelo qual se dá essa transferência lateral no interior das células não está estabelecido. Esses eventos de transferência intensificam a dependência entre organelas e núcleo, e provavelmente são essenciais à manutenção da associação endossimbiótica. Apesar de eventos de transferência e perda de genes ocorrerem provavelmente ao acaso, aparentemente existe uma direcionalidade, já que o núcleo apresenta uma tendência de adquirir genes, enquanto as organelas parecem perder genes redundantes. Uma explicação para essa direcionalidade seria que o núcleo é um ambiente geneticamente mais estável que as organelas.”

Isso demonstra que esses organismos criaram uma complexa relação interativa, onde os mecanismos de mitose são integrados. Células eucariontes não podem sobreviver sem mitocôndrias – da mesma forma que – eucariontes fotossintetizantes não podem sobreviver sem cloroplastos e, os endossimbiontes, não podem sobreviver fora dos hospedeiros.

Hoje, os procariontes com maior grau de parentesco com as atuais mitocôndrias são as bactérias pertencentes ao gênero Rickettsia; parasita intracelular obrigatório carregado por vários carrapatos, pulgas, e piolhos, e – em seres humanos – causador de doenças como o tifo.

Estimativas sobre a época de origem dos primeiros eucariontes têm sido obtidas a partir do tamanho das células em registros fósseis. Tais estimativas indicam que eucariontes fotossintetizantes já existiam há mais de 2 bilhões de anos atrás. Isso indica uma origem ainda mais antiga para as mitocôndrias, pois todas as células que apresentam cloroplastos também possuem mitocôndrias, indicando assim que as mitocôndrias precederam os cloroplastos.

Evidencias simples

Invaginação da membrana plasmática

Não é difícil, a partir do conhecimento da composição e estrutura das membranas celulares, evidenciar a Teoria da Invaginação da Membrana Plasmática. Para começar, a composição e a estrutura das membranas plasmáticas e das membranas das organelas celulares são muito semelhantes, indicando mesma origem. Além disso, existe uma peculiaridade muito interessante entre elas. Todas as membranas plasmáticas possuem, ao redor do seu lado extracelular, uma estrutura formada por carboidratos, responsável pelo reconhecimento molecular e comunicação intercelular. Essa estrutura na membrana plasmática é conhecida como Glicocálix. Curiosamente, nas organelas, tais carboidratos (possivelmente derivados do Glicocálix) estão voltados para o interior das organelas (para o lúmen da organela). Tal fato é uma forte indicação da origem invaginativa dessas organelas membranosas.

Origem endossimbiótica de mitocôndrias e cloroplastos

Fortes evidências favorecem a teoria da simbiose entre organismos unicelulares. Uma delas, e possivelmente a mais importante, é o fato de que mitocôndrias e cloroplastos são envolvidos não por um, mais dois envoltórios membranosos. A membrana mais externa possui composição semelhante à membrana plasmática da célula hospedeira, além de possuir orientação contraria. Enquanto isso, a membrana mais interna possui composição semelhante às membranas plasmáticas de organismos procariontes e possui orientação original. Logo, a membrana externa tem origem no fagossomo (bolsa membranosa que contém a célula capturada pelo processo de fagocitose) da membrana da célula hospedeira e a membrana mais interna tem origem na membrana do procarionte “ingerido”.
Como se isso não fosse suficiente, ainda é possível apontar aqui outras evidencias sugestivas:

1 – as proteínas presentes nas mitocôndrias e cloroplastos são mais semelhantes aos seus análogos procarióticos do que aos eucarióticos;

2 – existem procariontes de vida livre com forte semelhança estrutural, bioquímica e genética com as respectivas organelas;

3 – as organelas possuem genoma próprio, com organização semelhante ao genoma procariótico;

4 – os RNAs (ribossômico, transportador e mensageiro) das organelas também são mais semelhantes aos de procariontes;

5 – as organelas são semi-independentes, com capacidade de replicação

6 – as organelas e suas funções estão, alternativamente, presentes ou ausentes das células eucarióticas, não sendo encontrados hoje, bilhões de anos depois, organismos em que esse processo deixou intermediários.

A humilde origem

As células eucarióticas, em nosso mundo atual, estão incrivelmente difundidas e especializadas. São elas que permitem a existência dos complexos organismos multicelulares que as mesmas compõem. Um exemplo disso são as células que formam o corpo humano, todas elas realizando diferentes funções ou estruturando diferentes tecidos. Existem trilhões de células eucarióticas em nosso corpo, consequentemente, existe quantidade ainda superior de mitocôndrias, produzindo a energia utilizada em atividades cotidianas. Já os cloroplastos, em células vegetais, produzem o alimento das plantas, sendo responsáveis, assim, por gerar a base de toda a cadeia alimentar. Ambos – mitocôndrias e cloroplastos – além de serem de fundamental importância para a manutenção da vida na Terra, inquestionavelmente, também nos fornecem indícios sobre a história da vida no planeta. É com esses indícios que constatamos o simples início de nossa existência.

Lagartos, gatos, algas, golfinhos, arvores, aranhas, cavalos, abelhas e, inclusive, seres humanos (dentre outros) são todos constituídos pelas mesmas unidades básicas originadas a partir desse processo aparentemente simples, porém extraordinário. Todos são constituídos por células eucarióticas que, apesar de diferirem em uma ou outra característica, possuem a mesma estrutura básica e a mesma origem humilde.

José Carneiro Ribeiro Neto

Aluno de Biomedicina
Universidade Tiradentes – Unit

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Créditos das imagens:

Ilustração de célula eucariótica: RUSSELL KIGHTLEY / SCIENCE PHOTO LIBRARY
Terra primitiva: Documentário Como Nasceu Nosso Planeta – The History Channel
Cloroplasto: DR DAVID FURNESS, KEELE UNIVERSITY / SCIENCE PHOTO LIBRARY
Bactéria Rickettsia rickettsii : ASM / SCIENCE PHOTO LIBRARY
Mitocôndria: PROFESSORS P. MOTTA & T. NAGURO / SCIENCE PHOTO LIBRARY

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Referências:

CARVALHO, Hernandes F.; RECCO-PIMENTEL, Shirlei M. A Célula. 2.ed. Barueri, SP: Manole, 2007

MATIOLI, Sérgio R. Biologia Molecular e Evolução. São Paulo, SP: Holos, 2001

LOPES, Sônia. http://biosonialopes.editorasaraiva.com.br//

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Charles Darwin: o postilhão dos Andes

Autor: Nelio Bizzo*
Fonte: Jornal Darwin 200 anos, UFRGS, 12 de fevereiro de 2009.

Tudo aconteceu em poucos dias. Charles Darwin, jovem recém-formado, recebeu a notícia que fora indicado para acompanhar uma expedição que iria dar a volta ao mundo, logo depois de terminar uma pequena viagem de campo com seu professor de Geologia. Na longa viagem, seriam visitadas terras jamais estudadas. Seu martelo geológico haveria de ser o primeiro a picar uma rocha nas alturas das encostas dos Andes e o converteria no novo mensageiro a anunciar coisas inauditas.

Além de convencer o pai a autorizar a viagem e bancar-lhe os gastos ao longo de alguns anos, era necessário ainda vencer a contrariedade do também jovem capitão do navio. Era o segundo desafio, pois a participação política dos Darwin (o lado paterno) e sobretudo dos Wedgwood (o lado materno), industriais muito bem sucedidos na convulsionada Inglaterra de inícios do século XIX, tinha sido totalmente oposta à da família do capitão, de uma aristocracia antiga e ainda muito importante, embora francamente decadente.

Uma viagem ao redor do mundo era, àquela época, algo parecido com uma expedição espacial hoje em dia. Para experimentar a sensação de gravidade zero, é preciso estar em meio a um aparato tecnológico muito avançado, batendo às portas da fama planetária (ou em um elevador enferrujado que despenca do alto de um velho edifício). Naquela época, a viagem marítima requeria cuidados especiais: jamais desembarcar desarmado, ter um bom par de pistolas à mão e boa pontaria além de total desconfiança nos povos visitados.

O jovem capitão Robert FitzRoy era exigente e tão meticulosamente perfeccionista que haveria de fazer e refazer sua tarefa cartográfica diversas vezes. Mapear com precisão a costa do extremo sul da América do Sul tinha se tornado uma obsessão. O navio escolhido tinha sido o mesmo com o qual tivera visitado a região anos antes. O HMS Beagle voltaria ao local que levara à loucura seu capitão anterior, John Stokes. “A alma de um homem morre com ele”, escreveu o desesperado capitão instantes antes de meter uma bala na cabeça, certo de que não haveria vida além da morte.

Mas a partida da Inglaterra não seria nada fácil. Numa época em que os casamentos dos ricos eram muito mais pactos entre famílias, em que implicações patrimoniais disputavam palmo a palmo as razões do coração, o jovem Darwin estava dividido. Ele queria viajar, ver com os próprios olhos aquilo que lera em [Alexander von] Humboldt. Mas ele sabia que uma jovem, muito rica e esplendidamente bela, estava ansiosa por receber seu pedido de casamento. O Dr. Robert torcera o nariz para a viagem do filho, mas certamente o incentivaria a ir adiante e fundir os Darwin com os Mostyn-Owen. Eles moravam numa suntuosa propriedade, em meio a um bosque, onde o jovem Charles afiara a pontaria. Agora, poderia dar seu mote final e deixar contentes a todos.

Decidiu-se pelo mais difícil e incerto, e partiu com juras de amor, com a promessa de que alguém o aguardaria o tempo que fosse, e no retorno a encontraria apenas um pouco mais velha e confusa, mas essencialmente a mesma.

A viagem durou quase cinco anos e trouxe de volta à Inglaterra duas convicções e uma desilusão amorosa. Para FitzRoy, as marcas do Dilúvio Universal podiam ser encontradas nos restos marinhos que jaziam acima do nível do mar. No entanto, o jovem Charles Darwin trouxe para sua terra a certeza de que as montanhas eram testemunhas elevadas de um passado antigo e remoto, que abrigara ancestrais monstruosos que desapareceram sem deixar descendentes. Esta era a mensagem do postilhão dos Andes.

A possibilidade de criação de variedades de couves, flores, pombos, galinhas e cães era bem conhecida. Ela podia ser feita pela mão do ser humano. Mas, e a criação de novas espécies? Ela poderia dispensar uma intervenção sobrenatural? Um processo corriqueiro e absolutamente natural poderia explicar a presença da espécie humana em nosso planeta? Essa era a segunda convicção que o Beagle trouxera de volta à Inglaterra naqueles idos de 1836.

Talvez a criação de couves pudesse explicar como primatas peludos poderiam ter gerado homens de coração mole, como aquele que passou sua primeira noite no Rio de Janeiro soluçando em prantos a perda da mulher amada e o fim do sonho de tê-la como esposa. Mas eles tinham tido como descendentes também mulheres determinadas, como aquela que esqueceu suas juras de amor ao receber o pedido de casamento de um membro da nobreza, mesmo que comprovasse apenas setenta e um costados, mas dono do grandioso castelo medieval da região.

O jovem Darwin não seria mais um ministro anglicano, responsável por uma bela paróquia arrecadando impostos e tendo filhos com uma bela esposa. Ele seria um homem da ciência, um trabalhador incansável, talvez como uma abelha assexuada.** Em 1859 veio à luz o livro que daria fama planetária a Charles Darwin, maior do que a dos homens que conheceram a sensação de ausência de gravidade para além de nossa atmosfera. Naquele ano foi publicado A Origem das Espécies, um livro que até hoje evoca as mais diferentes reações. Ele sintetizava a grande convicção que nascera a bordo do Beagle, enfibrada com mecanismos desenvolvidos em terra firme britânica, em tempo mais recente. A seleção natural explicava como o monótono suceder de gerações acabava por gerar as novidades evolutivas no suceder das eras geológicas.

O sucesso evolutivo não pode existir sem seu contrário. Assim como a dúvida da morte é a única certeza da vida, a extinção é o evento mais frequente que acompanha a origem das espécies na Terra. Quase todas as formas de vida que apareceram em nosso planeta se extinguiram. Algumas ainda resistem, mas não para sempre. Assim como as fibras que tecem uma folha de papel serão esgarçadas pela ação do tempo, assim como os olhos que lêem estas palavras deixarão de poder fazê-lo um dia, assim como as mãos que escrevem este texto perderão essa habilidade mais dia, menos dia, assim as espécies atuais seguirão seu destino e se extinguirão no futuro. Os mamíferos promissores já se foram. Deles, ou melhor, dos com mais sorte, restam apenas alguns pálidos e imensos fósseis, ainda que toscos e inertes.

Em todo o planeta, uma única espécie convive com a consciência do destino que a aguarda. Tanto sabe que, por vezes, o precipita, fazendo o fim da existência se aproximar rapidamente. Mas, mesmo o mais sereno ser humano, se esclarecido, não fica mais feliz com esse fazer e tampouco está convicto da utilidade desse saber.

E não sabe se deve agradecer por ele.

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* Nelio Bizzo é professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), e autor do livro Darwin: do Telhado das Américas à Teoria da Evolução (Odysseus, 2002).

** Darwin se casou com sua prima Emma Wedgwood em 29 de janeiro de 1839 e teve com ela 10 filhos.

Arqueoptérix era mais dinossauro que ave

Novas análises da estrutura microscópica dos ossos do extinto arqueoptérix, publicadas nesta semana na revista PLoS One, revelam que este animal era mais dinossauro que ave. O estudo é uma parceria entre pesquisadores dos Estados Unidos, Alemanha e da China.

Tecnicamente falando, aves são dinossauros. Porém, o arqueoptérix tinha um crescimento mais lento, seus ossos não cresciam tão rapidamente quanto as aves modernas. O que a pesquisa mostra é que, diferente do que se pensava antes, o crescimento rápido dos ossos não é um pré-requisito para o voo, pois o arqueoptérix voava mesmo tendo crescimento mais lento.

Observar um bando de arqueoptérix há 150 milhões de anos atrás deveria ser bem diferente de observar um bando de aves modernas. Devido a seu crescimento acelerado, os indivíduos adultos de uma espécie como o pombo urbano, por exemplo, parecem todos iguais em tamanho. Os grupos de arqueoptérix teriam uma aparência distinta, com indivíduos de vários tamanhos diferentes voando por aí.

O primeiro fóssil de arqueoptérix foi achado em 1860, um ano depois de Darwin ter publicado sua obra maior. Na época, a peça paleontológica ajudou a convencer muitos sobre a veracidade da evolução: um animal com características reptilianas (dentes, garras, e cauda óssea) apresentando uma vasta cobertura de penas só pode ser evidência de que nem sempre as criaturas providas de dentes foram desprovidas de penas, nem as criaturas com penas foram sempre desprovidas de dedos e garras nos membros superiores.

ResearchBlogging.orgUma conclusão rápida, portanto, seria de que o arqueoptérix tivesse sido a primeira ave. Porém, é também uma conclusão baseada em poucas evidências. As características extraordinárias do arqueoptérix indicavam a inequívoca ancestralidade comum entre aves e dinossauros (o fato de terem evoluído a partir de uma mesma origem), porém eram insuficientes para afirmações sobre a posição deste fóssil neste processo.

Agora, com a análise de Norell, Erickson, Zhonghe Zhou e colaboradores, há mais evidências para resolver essa história: os pesquisadores cortaram finíssimas fatias dos ossos longos do arqueoptérix e de outros fósseis como Jeholornis prima (considerado uma ave primitiva), Sapeornis chaochengensi (que tem três dedos e dentes), Velociraptor mongoliensis (um dinossauro considerado próximo das aves), Mahakala omnogova (que parece uma miniatura do arqueoptérix) e Ichthyornis dispar (um fóssil de 94 milhões de anos mais parecido com as aves), entre outros.

A análise mostrou que os ossos do arqueoptérix eram como os ossos de dinossauros como o Velociraptor (assim como os dos fósseis Jeholornis e Sapeornis), o que significa que o arqueoptérix crescia lentamente, em cerca de 970 dias até a idade adulta, quando atingia o tamanho aproximado de um corvo. Os ossos do arqueoptérix tinham poucos vasos sanguíneos, como os ossos de um lagarto, diferentes dos ossos das aves, que têm muitos vasos sanguíneos.

Outros fósseis, como Ichthyornis e Confuciusornis mostraram ter estrutura óssea mais próxima da observada em aves atuais, o que sugere que boa parte da fisiologia das aves surgiu depois do advento evolutivo do voo.

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Crédito das imagens:

Archaeopteryx. JIM AMOS / SCIENCE PHOTO LIBRARY

– Microestrutura óssea de Archaeopteryx. Greg Erickson, 2009

– Reconstrução artística de Confuciusornis sanctus. RICHARD BIZLEY / SCIENCE PHOTO LIBRARY

Referência:

Erickson, G., Rauhut, O., Zhou, Z., Turner, A., Inouye, B., Hu, D., & Norell, M. (2009). Was Dinosaurian Physiology Inherited by Birds? Reconciling Slow Growth in Archaeopteryx PLoS ONE, 4 (10) DOI: 10.1371/journal.pone.0007390

Darwin e Evolução segundo a Dra. Rosana Tidon

Dr. Marcelo Hermes-Lima entrevista a Dra. Rosana Tidon sobre Charles Darwin e a teoria da evolução. A professora fala também sobre a história do Evolucionismo e novas perspectivas na área.

Marcelo Hermes-Lima, PhD, é professor de Bioquímica Médica e Ambiental na Universidade de Brasília (UnB), e Rosana Tidon, PhD, é professora de Evolução na UnB e chefe do Laboratório de Biologia Evolutiva na mesma instituição. Esta entrevista foi ao ar pela primeira vez no programa Ciência Brasil da Painel Brasil TV.

O Evolucionismo.ning.com agradece pela autorização dos dois cientistas para a republicação deste vídeo.