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De volta ao cambriano: Dividindo o evento

Entre o público leigo ainda existe bastante confusão sobre o que foi a ‘explosão cambriana’. Por este motivo tenho abordado esta questão em diversas ocasiões, com mais ênfase em um artigo introdutório sobre o tema (veja “A Explosão Cambriana: Uma introdução”), mas alguns esclarecimentos adicionais podem ajudar a dissipar alguns mal entendidos que assolam mesmo alguns cientistas.

Aqui aproveito a discussão do zoólogo Andrew Parker. Ele  explica que existem duas formas de resumir o que foi a ‘explosão cambriana’. A primeira delas, e que segundo ele  é inadequada, simplesmente encara este evento como o surgimento dos vários filos animais, com seus distintos planos corporais etc, que é, mais ou menos, a versão canônica. Porém, na outra abordagem, que Parker considera mais precisa e que é apoiada por certas evidências fósseis e principalmente por várias análises filogenéticas, é a de que este evento foi mais circunscrito, sendo apenas a grande radiação adaptativa espontânea das partes do corpo externas, especialmente as ‘esqueletizadas’, em todos os filos* que já tinham seus planos corporais internos básicos formados*. Em seu livro em ‘In the blink of an Eye, Parker, mostra esta distinção em duas figuras.

Em (A) podemos ver que tanto os planos corporais como as partes externas se diversificaram durante mais ou menos ao mesmo tempo ao longo de todo o processo de divergência das linhagens .

Já em (B), que segundo Parker é o modelo mais apropriado, a figura identifica mais precisamente o que foi a explosão cambriana: A evolução simultânea das formas externas em todos os filos, portanto, ‘desacoplando’ o processo de cladogênese do de disparidade morfológica externa. Parker então chama a atenção para o seguinte detalhe:

A evidência atual sugere que “evento” Pré-cambriano – a evolução dos planos corporais internos o – não foi explosivo, mas gradual, com duração de dezenas ou centenas de milhões de anos. Isto é provavelmente porque o “evento” Pré-cambriano envolveu um animal evoluindo de uma forma anterior, e assim por diante – uma condição sem vínculo com a explosão cambriana. O”evento” Pré-cambriano foi mais um impulso na evolução do que uma explosão. É possível que a explosão cambriana tenha acontecido em um momento no tempo, mas não tão o “evento” Pré-Cambriano. Para resumir, a velha interpretação da “explosão cambriana” é, na verdade, a combinação da explosão cambriana e “surto” o Pré-Cambriano. Em geral, o surto foi o evento genético principal e a explosão foi mais impulsionada por algum fator externo.”

A hipótese de Parker é que a explosão cambriana propriamente dita teve como principal causa uma corrida armamentista evolutiva envolvendo predadores e presas que teria sido impulsiona originalmente pela evolução dos olhos que desta maneira teriam propelido a co-evolução de ‘armaduras’ protetoras e estratégias de evasão e detecção de presas e predadores [Veja também “Ver ou não ver? Eis a questão do fanerozóico?“]. Porém, neste post, entretanto, quero chamar a atenção para a divisão que Parker faz destas duas fases da evolução dos animais com simetria bilateral que permite compreender que a evolução da organização interna dos diversos filos, pelo menos de seus representantes basais, e a evolução de suas partes externas ocorreram em períodos e com velocidades bem diferentes.

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*Esta proposta é uma forma de ideia de ‘pavio de queima lenta’ (veja “O ‘pavio filogenético’ e a ‘explosão cambriana’ não se fundem.“) que já comentei em outras ocasiões, mas além deste fato é importante reconhecer que, mesmo em relação a evolução dos planos corporais internos, ao analisar os organismos do cambriano estamos lidando em muitos casos com formas basais, os chamados ‘grupos tronco’ que ainda não tinham evoluído muitas das características diagnósticas dos filos modernos, algo que devo abordar de novo em outro artigo.

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Referências:

  • Parker, Andrew. In the Blink of an Eye: How Vision Sparked the Big Bang of Evolution. Cambridge, MA: Perseus Pub, 2003. 316 p

Ancestralidade comum universal: A evidência está nas proteínas [Tradução]

Embora, do ponto de vista qualitativo, as evidências de ancestralidade comum universal sejam  consideradas esmagadoras pela comunidade científica, até muito pouco tempo não havia sido realizado nenhum teste quantitativo formal que avaliasse outras possibilidades,além da ancestralidade comum universal,  para explicar o padrão de similaridades moleculares entre todos os organismos vivos conhecidos. Entre as hipóteses rivais estariam as que postulam múltiplas origens e que implicam, portanto, que as semelhanças seriam devidas da convergência evolutiva, isto é, teriam surgido como resultado de demandas ecológico-funcionais semelhantes que teriam feito linhagens independentemente evoluírem biomoléculas com sequências muito parecidas por meio da seleção natural,  apenas por que as funções que elas desempenhariam seriam muito semelhantes e  essenciais. Embora esta possibilidade possa soar menos parcimoniosa e existam muitos argumentos qualitativos que reforcem esta ideia, não estava claro se ela não poderia realmente explicar melhor os dados biomoleculares, especialmente levando-se em conta os modernos modelos de evolução de sequências de biomoléculas.

O bioquímico, especializado em bioinformática estrutural e evolução molecular, Douglas L. Theobald – que já havia escrito um excelente compendio de evidências em apoio a evolução (o famoso, 29+ Evidences for Macroevolution: The Scientific Case for Common Descent”) – tomou para si esta tarefa e, usando diversos modelos de evolução de biosequências e métodos estatísticos de escolha e seleção entre modelos (veja o verbete ‘model selection‘ da wikipedia) – como o critério de informação Akaike (‘Akaike information criterion‘, AIC) – produziu um impressionante artigo sobre o assunto, no qual apresenta resultados que não só dão apoio a visão mais canônica de que toda a vida atual é derivada de um ancestral comum universal, mas obteve um apoio probabilístico para esta hipótese de cair o queixo, como pode ser visto na tradução do artigo de Katherine Harmon para a Scientific American sobre o incrível trabalho de Theobald publicado na Nature em 2010.

Assim, ao serem comparados com uma ampla gama de modelos biológicos de evolução que envolvem a ancestralidade independente de grandes grupos taxonômicos, os modelos de ancestralidade comum universal, ao serem avaliados por testes de seleção do modelos, dão um apoio espetacular à hipótese de ancestralidade universal comum, independentemente da presença de transferência horizontal de genes e eventos de simbiogênese entre linhagens.

Segue a tradução de um artigo da Scientific American de 2010 que resume o que Theobald fez e mais alguns comentários meus ao final, contextualizando mais a questão e abordando algumas das críticas feitas por outros cientistas e as respostas dadas a eles por Theobald.

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A prova [1] está nas Proteínas:

Teste apóia ancestral comum universal para toda a Vida

Um pesquisador coloca à prova o pressuposto biológico básico de um único ancestral comum – e descobre que a análise genética avançada e estatísticas sofisticadas apoiam a antiga proposta de Darwin.

Fonte: Scientific American [The Proof Is in the Proteins: Test Supports Universal Common Ancestor for All Life ]

Autora: Katherine Harmon quinta-feira, 13 de maio, 2010 | 22

Tradução: Rodrigo Véras


TUDO EM FAMÍLIA: A suposição comum de que toda a vida na Terra surgiu de um único ancestral comum tem sido uma hipótese difícil de provar. Nova análise seleciona algumas das teorias concorrentes. Imagem: ISTOCKPHOTO/EBSTOCK

A primeira forma de vida da terra, flutuando na espuma proverbial dos mares primordiais que, eventualmente, deu origem às árvores, as abelhas e aos seres humanos, não é apenas popular pressuposição Darwiniana, mas também uma premissa biológica essencial da qual muitos pesquisadores tomam como parte da fundação de seu trabalho.

No século 19, Charles Darwin foi além de outros, que tinham proposto que poderia haver um ancestral comum a todos os mamíferos ou animais, e sugeriu que provavelmente houve um ancestral comum para toda a vida no planeta – plantas, animais e bactérias.

Uma nova análise estatística leva essa suposição para a bancada e descobre que não só se segura, mas na verdade é esmagadoramente sólida.

Não era já óbvio, a partir da descoberta e decifração do DNA, que todas as formas de vida são descendentes de um único organismo comum, -ou, pelo menos, uma espécie basal? Não, diz Douglas Theobald, professor assistente de bioquímica da Brandeis University e autor do novo estudo, detalhado na edição de 13 de maio da revista Nature. (Scientific American faz parte do Nature Publishing Group). Na verdade, ele diz: “Quando eu entrei nesse negócio, eu realmente não sabia qual seria a resposta.

Apesar das dificuldades de testar formalmente a evolução – especialmente voltando eras atrás até o surgimento da vida em si-Theobald foi capaz de executar análises estatísticas rigorosas das sequências de aminoácidos de 23 proteínas universalmente conservadas entre as três principais divisões da vida (eucariotas, bactérias e archaea). Ao introduzir essas sequências em vários modelos relacionais e evolutivos, ele descobriu que um ancestral comum universal é pelo menos 10^2860 mais provável (ou ‘verossímil’ [2]) de ter produzido as modernas variações de seqüência das proteínas do que até mesmo cenário seguinte mais provável (envolvendo vários ancestrais separados).*

“A evolução faz bem onde ele pode ser testado”, diz David Penny, um professor de biologia teórica no Instituto de Biologia Molecular BioSciences da Universidade Massey, na Nova Zelândia e co-autor de um editorial de acompanhamento. No entanto, ele observa que a evolução pode fazer “previsões testáveis ​​sobre o passado (especialmente as quantitativas)“, no mínimo, complicadas. “QueTheobald possa ter concebido um teste formal”, diz ele, “foi excelente …. Provavelmente vai levar a um salto no que se espera da avaliação formal de hipóteses, o que iria ajudar a todos.

Animosidade ancestral comum

As descobertas de meados do século 20, sobre a universalidade do DNA “realmente definiram isso para as pessoas” em termos estabelecer na cultura popular – e acadêmica – que houve um ancestral universal comum único para toda a vida conhecida na Terra, Theobald diz. E desde então, “tem sido amplamente assumido como verdade”, observa ele.

Mas, nas duas últimas décadas, novas dúvidas surgiram em alguns círculos. Microbiologistas adquiriram uma melhor compreensão do comportamento genético das formas de vida simples, que pode ser muito mais amorfo do que a típica transferência vertical de genes de uma geração para a seguinte. A capacidade de microorganismos, tais como bactérias e vírus, de trocarem genes lateralmente entre os indivíduos – e mesmo entre espécies – mudaram alguns dos conhecimentos básicos estruturais do mapa da evolução. Com as transferências de genes horizontais, assinaturas genéticas podem mover-se rapidamente entre os ramos, rapidamente transformando uma árvore tradicional em uma teia emaranhada. Esta dinâmica “lança dúvida sobre este modelo da árvore da vida“, diz Theobald. E “uma vez que você lança dúvidas sobre isso, meio que lança uma dúvida sobre ancestralidade comum também.

Com a descoberta dos archaea como o terceiro principal domínio da vida – além das bactérias e dos eucariontes – muitos microbiologistas tornaram-se mais duvidosos de um único ancestral comum por trás de todos.

Um teste para a evolução


Outros pesquisadores haviam colocado certas seções de vida à prova, incluindo uma análise estatística de 1982 semelhante feita por Penny testando a relação de várias espécies de vertebrados. Theobald descreve o artigo como “
legal, mas o problema lá é que eles não estão testando ascestralidade universal.” Com os avanços na análise genética e poder estatístico, no entanto, Theobald viu uma maneira de criar um teste mais abrangente para toda a vida.

No decorrer de sua pesquisa, Theobald foi bater contra comum, mas “quase insolúvel, problema evolutivo” em biologia molecular. Muitas macromoléculas, como proteínas, têmestruturas similares tridimensionais, mas seqüências genéticas muito diferentes. A pergunta que o atormentava era: Seriam essas estruturas semelhantes de evolução exemplos de evolução convergente ou evidência de ancestralidade comum?

“Todas as evidências clássicas para a ancestralidade comum são qualitativas e baseiam-se em semelhanças compartilhadas, diz Theobald. Ele queria descobrir se ter focado nas semelhanças teria levado os cientistas a se extraviarem.

Suposições abandonadas

A maioria das pessoas e até mesmo cientistas operam sob a premissa de que as semelhanças genéticas implicam uma relação ou antepassado comum . Mas, assim como semelhanças na aparência física ou estrutura, essas suposições “podem ​​ser criticadas“, observa Theobald. A seleção natural forneceu numerosos exemplos da evolução física convergente, tais como as caudas preênsis de gambás e macacos-aranha ou a línguas pegajosas longas de comer insetos dos tamanduás e tatus. E com a transferência horizontal de genes em cima disso tudo, argumentos similares poderiam ser feitos para as sequências genéticas.

“Eu realmente dei um passo para trás e tentei assumir o mínimo possível ao fazer essa análise”, diz Theobald. Ele rodou vários modelos evolutivos estatísticos, incluindo aqueles que levavam em em consideração a transferência horizontal de genes e outros que não. E os modelos que consideravam a transferência horizontal de genes acabaram fornecendo o maior suporte estatístico para um ancestral comum universal.

Origens obscuras

Theobald disse que seus resultados mais surpreendentes foram “o quão fortemente eles apoiam a ancestralidade comum.” Em vez de simplesmente terem sido desapontados com o apoio a um pressuposto de longa data, ele diz que, pelo menos, “é sempre bom saber que estamos no caminho certo.”



Estas descobertas não significam que um ancestral comum universal estabelece o padrão da “árvore da vida” o começo da dinâmica evolutiva. Nem, no entanto, que eles inferiram uma estrutura em “teia da vida”. O debate árvore contra teia continua sendo “muito controverso agora mesmo na biologia evolutiva”, diz Theobald, relutante em escolher um lado para si mesmo.

Uma das outras grandes incógnitas que restam é quando esse ancestral universal comum teria vivido e o com o que ele pode ter se parecido – uma questão que vai demandar mais do que os modelos estatísticos de Theobald para responder. Theobald também observa que o apoio para um ancestral comum universal não exclui a idéia de que a vida surgiu de forma independente mais de uma vez. Caso outras linhagens, totalmente distintas surgiram, no entanto, elas ou foram extintas ou permanecem ainda não descobertas.


A pesquisa provavelmente avançará para esses cantos escuros do início da evolução, nota Penny, uma vez que “os cientistas nunca estão satisfeitos.” Ele espera que os pesquisadores irão tentar resolver voltar para ainda mais cedo, antes do DNA assumir, e avaliar os estágios iniciais da evolução durante os dias de RNA.

Em um nível mais fundamental, Penny diz, que o artigo não deve pôr fim à avaliação dos pressupostos da ancestralidade. Em vez disso, deve ser um lembrete de que “nós nunca pensamos em todas as hipóteses possíveis“, diz ele.

Então, nunca devemos deixar de considerar alguma abordagem nova que não tenhamos pensado ainda.”

* Errata (5/13/10): Esta frase foi alterada após a publicação. Ela inicialmente afirmava que um ancestral comum universal é mais de 10 vezes mais provável.

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Notas do Tradutor:

[1] O termo ‘prova’ segue o artigo original de Harmon que usa a palavra ‘proof’, mas fica claro – especialmente conhecendo outros textos de Theobald e declarações no artigo de resposta aos críticos – que o termo ideal seria ‘evidência’.

[2] Cabe a ressalva que o termo originalmente usado é ‘likely’ que apesar de ser muitas vezes traduzido como ‘provável’, tem um significado técnico diferente relacionado com o conceito de verossimilhança (‘likelyhood‘) que é de fato no que se baseiam as comparações relativas entre os modelos [Para mais, veja oartigo de Nick Matzke sobre o artigo no blog Panda’s Thumb].

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Comentários Adicionais:

A figura abaixo extraída do comentário de Steel e Penny (2010) mostra que tipo de hipóteses foram testadas por Theobald, entre muitas outras combinações.

Uma das possibilidades de ascendência múltipla retratada na figura (a) é a de que a vida atual é oriunda de duas linhagens que se originaram independentemente uma da outra, com as proteínas  com funções similares tendo surgido em decorrência da evolução adaptativa convergente. Na figura (b) podemos observar a origem única (ancestralidade comum universal), pelo menos, após a evolução da síntese de proteínas. As transferências, por endossimbiose ou por transferência de lateral de genes, são mostradas por linhas tracejadas. As correlações entre os padrões de aminoácidos em diferentes posições são usadas ​​para testar entre as duas possibilidades. A abordagem, adotada por Theobald, compara os valores das verossimilhanças de quão bem diferentes modelos de evolução de sequências e ancestralidade ajustam-se aos dados, compensando para diferentes números de parâmetros.

Como diz Penny, as conclusões de Theobald não encerram o assunto, embora ofereçam um forte argumento para a ancestralidade comum universal e uma forma explícita de testar tal hipótese que pode ser refinada e corrigida a medida que novas informações e métodos de análise forem surgindo. Por exemplo, na mesma edição da revista Nature, dois pesquisadores,Yonezawa and Hasegawa, [veja aqui] oferecem críticas as conclusões de Theobald e deram um exemplo de duas famílias de sequências de ácidos nucleicos codificadoras de proteínas, aparentemente não relacionadas, que, ao serem analisadas usando o ‘critério de informação Akaike’ (AIC) de seleção de modelo, usado por Theobald, acabaram por favorecer a hipótese da origem comum das mesmas, o que estaria em erro com o que sabemos sobre este caso específico. Porém, em resposta, Theobald lembra que, embora possa parecer surpreendente, as sequências codificantes do exemplo dos dois pesquisadores foram alinhadas não no mesmo marco de leitura e as restrições do código genético acabam provocando correlações entre estas seqüências (e entre todas as seqüências codificantes) que realmente não são devidas à ancestralidade comum. Algumas delas surgem pelo simples fato de existir um viés de códons e por causa da própria estrutura do código genético. Por exemplo, na segunda posição dos tripletos de nucleotídeos que formam os códons existe uma forte inclinação para a Timina que tem uma chance duas vezes acima da média do que o esperado de ser encontrada nesta posição, enquanto a terceira posição é geralmente preenchida por uma Adenina por volta de 50% das vezes e por uma Guanidina, apenas por volta de 4% das vezes. Porém, estas correlações e vieses de sequência podem ser levadas em conta adotando-se modelos e parâmetros adequados que já são implementados em vários programas de análise filogenética de sequências de uso comum que utilizam codons, como o PAML, ou que usam os aminoácidos codificados (como o PhyML). E quando isso é feito, o resultado espúrio citado por Yonezawa e Hasegawa desaparece e a origem independente é escolhida como sendo muito mais ‘provável’.

Yonezawa e Hasegawa também criticam o fato de Theobald não ter explicitamente testado modelos que levassem em conta que sequências similares poderiam ter sido geradas por causa de restrições biofísicas e da seleção natural que teriam produzido correlações entre sequências que haviam se originado independentemente. Acontece que, além de não existirem modelos filogenéticos que permitam o teste específico destes cenários, uma ampla gama de resultados empíricos sugere fortemente que este não seria o caso para a altíssima similaridade do conjunto de proteínas universalmente presentes empregado nas análises por Theobald. Sem mencionar que a premissa de que restrições biofísicas poderiam levar a estas correlações espúrias não é sustentada pela simples observação de que não parecem existir modos únicos de se executar uma dada função bioquímica. De fato, existem  inúmeros exemplos de proteínas com similaridade de sequência indetectável e conformações tridimensionais que desempenham a mesma função bioquímica e celular. Além disso, mesmo caso se presuma que certas conformações protéicas sejam necessárias para uma determinada função, as evidências de biologia estrutural atuais indicam que os requisitos em termos de sequências para que se atinjam quaisquer conformações são extremamente baixos, na realidade, quase indistinguíveis da aleatóriedade.  Muitas grandes classes de proteínas com padrões tridimesionais muito parecidos não têm similaridade de seqüência detectável, o que fornece evidência direta que as exigências de seqüência, para qualquer configuração espacial particular de uma proteína e portanto de uma função, serem quase indistinguíveis do esperado pelo acaso.

Theobald, entretanto, admite que estes argumentos são circunstanciais e qualitativos, não devendo substituir um teste mais formal quando houverem dados e modelos mais apropriados; admitindo que ele, realmente, não testou todas as hipóteses concorrentes possíveis (o que seria pedir um pouco demais, não?). Portanto, Theobald, tem plena consciência de que sua análise não será a “última palavra sobre ancestral comum”, enfatizado que, em nenhum momento, ele pretendeu oferecer uma “prova” absoluta de ancestralidade comum universal. Como ele mesmo afirma, o ponto principal é que este arcabouço de teste com base na seleção de modelos traz uma enorme vantagem em relação ao que era feito até então, pois caso um novo modelo, com uma bem definida função de probabilidade, venha a ser proposto, então, será possível facilmente compará-lo aos modelos de ancestralidade comum e ver como ele se sai frente a eles.

É neste espírito que avançamos na compreensão de nosso passado, botando à prova mesmo pressuposições consideradas básicas e avaliando sua ‘probabilidade’ frente a outras possibilidades sempre que for possível.

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Referências

  • Theobald DL “A formal test of the theory of universal common ancestry.” Nature 465(7295):219-222. [pdf]

  • Yonezawa T, Hasegawa M. Was the universal common ancestry proved? Nature. 2010 Dec 16;468(7326):E9; discussion E10. doi: 10.1038/nature09482. PubMed PMID: 21164432.

  • Theobald DL (2010) “Was the universal common ancestry proved? Reply” Nature 468(7326):E10. [pdf]

  • Steel M, Penny D. Origins of life: Common ancestry put to the test. Nature. 2010 May 13;465(7295):168-9. doi: 10.1038/465168a. PubMed PMID: 20463725. [pdf]

  • Theobald DL. On universal common ancestry, sequence similarity, and phylogenetic structure: the sins of P-values and the virtues of Bayesian evidence. Biol Direct. 2011 Nov 24;6(1):60. PubMed PMID: 22114984; PubMed Central PMCID: PMC3314578. [pdf]

  • Kadane, J.B. and Lazar, N.A. Methods and Criteria for Model Selection Journal of the American Statistical Association Volume 99, Issue 465, 2004 DOI: 10.1198/016214504000000269

 

Mãos: Feitas (Também) Para Agredir?

Vi uma matéria muito interessante que foi publicada no dia 20 de dezembro de 2012 no portal iG e gostaria de compartilhá-la com vocês, meus amigos do Evolucionismo. O título da reportagem logo me chamou à atenção: “Mão humana pode ter evoluído para agredir, diz estudo“. Como assim? Me perguntei e resolvi ler o corpo da matéria ilustrada com uma foto de um boxeador esmurrando o seu adversário no ring. Está escrito lá:

“A mão humana pode ter evoluído para se servir melhor à agressão, segundo um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Utah, nos Estados Unidos.

Os pesquisadores usaram instrumentos para medir a força e a aceleração quando praticantes de artes marciais golpeavam sacos de pancadas. Eles descobriram que a estrutura do punho provê o apoio que aumenta a habilidade dos nós dos dedos de transmitir a força de um golpe. Os detalhes da pesquisa foram publicados no periódico Journal of Experimental Biology.”

Continua a matéria:

“Ficamos surpresos em saber que os golpes de mão fechada não têm mais força do que os com a mão aberta”, disse à BBC um dos autores do estudo, David Carrier.

Logicamente, a superfície atingida com o punho fechado é menor, então há um impacto maior do que com a mão aberta.”

“A força por área é maior em um golpe com punho fechado e isso é o que causa os danos localizados no tecido atingido”, explica Carrier.

“Há uma vantagem de desempenho nesse sentido. Mas o foco real do estudo era descobrir se as proporções da mão humana permitiam apoio (para os golpes)”, diz.

Os pesquisadores descobriram que fechar o punho realmente provê uma proteção maior para os ossos delicados da mão. Fechar o punho aumenta em quatro vezes a rigidez das juntas metacarpo-falangeais (que são visíveis quando o punho é fechado).

Fechar o punho também dobra a capacidade das falanges proximais (os ossos dos dedos que se articulam com as juntas metacarpo-falangeais) de transmitir a força do golpe.

Os pesquisadores afirmam que a mão humana também foi moldada pela necessidade de habilidade manual, mas afirmam que várias proporções diferentes da mão seriam compatíveis com uma melhor habilidade para manipular objetos.”

“Entretanto, pode haver somente um conjunto de proporções esqueletais que permitem que a mão funcione tanto como um mecanismo para manipulação precisa quanto como um taco para golpes”, afirmam os autores do estudo.

“Por fim, a importância evolutiva da mão humana pode estar em sua notável habilidade para servir a duas funções incompatíveis, mas intrinsecamente humanas”, observam.

Para Carrier, muitos pesquisadores podem ter evitado esse tipo de análise por aversão à ideia de que a agressão pode ter tido um papel em moldar o corpo humano.

“Acho que há muita resistência, talvez mais entre acadêmicos do que na população em geral, à ideia de que em algum nível os humanos são por natureza animais agressivos. Eu realmente acho que essa atitude, e as pessoas que tentam afirmar que não temos uma natureza, não nos ajudam”, argumenta.

“Acho que estaríamos melhor se enfrentássemos a realidade de que temos emoções fortes e que às vezes elas nos levam a nos comportarmos de maneira violenta. Se aceitássemos isso, estaríamos em condições melhores de prevenir a violência no futuro”.”

Então está aí. O que vocês acham, caros amigos?

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Nota do Editor: Comparada com a mão de chimpanzé, à esquerda, a mão humana, à direita, tem dedos e palmas mais curtos e um polegar mais longo, mais forte e mais flexíveis que não só permitem a manipulação refinada de ferramentas e outros objetos, como também permite que os seres humanos façam uso do punho cerrado, o que os macacos não podem fazer. De acodo com um novo estudo de pesquisadores da Universidade de Utah as mãos humanas teriam evoluido não só para a destreza manual, mas para a luta. (Crédito: Denise Morgan para a Universidade de Utah; University of Utah (2012, December 19). Fine hands, fists of fury: Our hands evolved for punching, not just dexterity. ScienceDaily. Retrieved December 23, 2012 )

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Para saber mais:

  • Morgan, M. H. Carrier, D. R. . Protective buttressing of the human fist and the evolution of hominin hands. Journal of Experimental Biology, 2012; 216 (2): 236 DOI: 10.1242/jeb.075713

  • Knight, K. Fighting shaped human hands (Inside JEB:) Journal of Experimental Biology, 2013, January 15 J Exp Biol 216, i. DOI: 10.1242/​jeb.083725

Crédito das Figuras:

PHIL JUDE/SCIENCE PHOTO LIBRARY

Viva Turing de novo, mais pistas sobre a evolução dos membros em vertebrados

Um dos grandes enigmas da moderna biologia diz respeito a compreensão de como estruturas morfológicas complexas podem ser produzidas através da modulação da expressão gênica no embrião de organismos multicelulares em desenvolvimento. A compreensão destes processos têm implicações vastas, que vão desde a explicação de mal formações, como a polidactilia, até  lançar luz sobre como, ao longo da evolução dos organismos multicelulares, especialmente animais, estruturas morfológicas de organismos ancestrais deram origem as de linhagens descendentes. 

Um grande problema com as abordagens mais tradicionais é que simplesmente apontar quais genes estão envolvidos nos processos, e mesmo mostrar que existem diferenças em seus padrões de expressão, não são suficientes. O que normalmente é almejado é uma compreensão de como a expressão diferencial destes genes, por meios dos efeitos das interações de seus produtos na proliferação e morte celular localizadas, na diferenciação celular e nos movimentos e deformações de camadas de tecidos, resulta em mudanças complexas na forma dos organismos. É preciso portanto explicar como cascatas de reações químicas dentro das células, a liberação de moléculas de comunicação célula a célula e a alteração de seus números, seu padrão de movimento e de adesividade, produzem alterações espaço-temporalmente organizadas por meio das interações dinâmicas entre seus componentes em diversos níveis. Portanto, o que se quer mais precisamente é compreender como o padrão geral pode ser produzido e como ele pôde ser modificado, por alterações dos genes e das regiões controladoras de sua expressão, ao longo da evolução das diversas linhagens.

Estes terrenos da investigação científica são eminentemente multidisciplinares exigindo a combinação dos métodos e conceitos da genética molecular, com os da biofísica, da biologia do desenvolvimento, bem como da paleobiologia, mas também de estratégias de modelagem computacional e matemática. E aí que entram os mecanismos ‘formadores de padrão’ (definir) entre os quais os mecanismos baseados em sistemas de reação-difusão que foram originalmente proposto pelo matemático Alan Turing ainda no começo dos anos 50, pouco antes de sua trágica morte, que certamente está entre os mais investigados [Veja “Viva Turing ou como os camundongos conseguem seu palato enrugado.” e “É a evolução genética previsível? Parte II ou Além da genética parte I” e “De determinantes ‘genéricos’ aos ‘genéticos’: A importância da física nos primódios da evolução animal.”]. De acordo com Turing, dois reagentes químicos que interagem e difundem-se através do espaço por meio de processos de retroalimentação poderiam formar padrões espaciais de ondas interagentes. Isto é, a partir de duas substâncias químicas, respectivamente, um ‘ativador’ e um ‘repressor’, inicialmente distribuídas uniformemente,  por meio da dinâmica não linear das interações entre estes reagentes que amplificam pequenas flutuações locais e produzem ciclos autossustentáveis de atividade, seriam produzidos padrões espaciais e estruturas complexas em um meio originalmente homogêneo.

Durante um bom tempo o modelo de Turing para a formação de padrões, ainda que plausível, carecia de evidências mais diretas de sua ação em organismos vivos, como explica a primeira autora de um novo estudo sobre o tema, Rushikesh Sheth, pós-doutorada no laboratório de Mary Kmita, autora sênior de mais do artigo. [Veja “What mechanism generates our fingers and toes?”]. Mas este cenário tem mudado na última década, como recentemente ilustrado por estudos da formação do palato enrugado em camundongos (que comentamos aqui no evolucionismo.org Viva Turing ou como os camundongos conseguem seu palato enrugado.”),  além de muitos outros trabalhos que sugerem que este mesmo mecanismo do tipo proposto por Turing (ou alguma variação dele) desempenhe um papel no crescimento de estruturas como penas e folículos capilares, no padrão de ramificação dos pulmões, etc. Desta vez, em um artigo publicado nesta edição de dezembro da revista Science, uma equipe de pesquisadores apresentam evidências de uma papel para este mecanismo formador de padrão durante o desenvolvimento dos dedos nas patas de camundongos, indicando uma possível via para a formação dos membros autopodes a partir de nadadeiras com projeções ósseas encontradas em vertebrados aquáticos ancestrais.

Em mamíferos, o que inclui nós seres humanos, os padrões de mudança ao longo do desenvolvimento embrionário dependem da ação de genes que funcionam como grandes ‘interruptores’, ativando e reprimindo uma série de outros genes e seus produtos em uma cascata de eventos de transdução de sinal e de ativação diferencial de vias bioquímicas. Entre estes genes estão os muito conhecidos  genes Hox – os mesmos por trás, por exemplo, da formação do eixo antero-posterior, isto é, cabeça-cauda, tanto em vertebrados como em invertebrados com simetria bilateral, mas também os genes associados as vias Shh (Veja Mais pistas sobre as origens do membros nos vertebrados), ambos os grupos também estando envolvidos na formação de membros durante a embriogênese. 

O padrão de formação dos dedos tradicionalmente tem sido mais comumente interpretado com dependendo da formação de um ‘gradiente morfogenético‘ em que a proteína codificada pelo de Sonic Hedgehog (Shh) funcionaria como ‘morfógeno’ (isto é, uma molécula difusível com papel de ativação de determinados estados celulares) emanando da ‘zona de atividade polarizante’ (ZPA) que consiste em um aglomerado de células mesodérmicas na borda posterior do broto do membro a partir do qual se estabeleceria um gradiente com os níveis máximos do morfógeno na região posterior.

Neste modelo para a formação dos dedos, a proteína Gli3 seria a principal mediadora da sinalização da via Shh e alterações neste gene seriam uma das causas genéticas da polidactilía. Porém, ao contrário das expectativas, tanto o Shh como Gli3, parecem dispensáveis para este processo, inclusive com mutantes nulos para Gli3 (ou seja, em que o gene Gli3 não é expresso) exibindo fenótipos de membros polidáctilos idênticos aos que ocorrem na sua presença, o que sugere que uma série de dedos pode se formar iterativamente na ausência de Shh, o que é mais compatível com um mecanismo formador de padrão do tipo Turing que já havia sido proposto como o responsável pela formação de um pré-padrão nesta porção distal do broto do membro que guiaria o processo de condrogênese, ou seja, de formação de agregados de tecido cartilaginoso.

Uma das previsões específicas deste modelo é que o período dos dedos, ou comprimento de onda (que pode ser definido como a espessura combinada de ambos os dígitos e da região interdigital) deve estar sujeito a modulação por perturbações no parâmetro correto da rede de genes que controla o processo de diferenciação, levando a membros autopodes com dedos de diferentes números e espessuras, o que, segundo o time de pesquisadores responsável pelo artigo da Science, nunca havia sido claramente observada até à data. E foi exatamente isso que os cientistas responsáveis pelo estudo obtiveram como resultando ao usaram métodos de análise genética para estudar a formação dos dedos durante o desenvolvimento de camundongos, encarando este fenômeno como um processo iterativo que leva a um padrão intercalado, ‘dedo/não dedo’, portanto, análogo aos que tem sido modelados por sistemas de reação-difusão do tipo Turing.

Embora ainda houvessem incertezas de quais moléculas poderiam fazer parte desse mecanismo auto-organizado de formação de padrão, alguns genes Hox, que já sabidamente atuavam nas porções distais do broto o membro, Hoxa e Hoxd, eram candidatos óbvios, tanto por terem  um impacto bem documentado na formação dos dedos, como por interagirem em várias instâncias como as vias de dos genes Shh e Gli3.

Os biólogos conseguiram mostrar que ao reduzirem progressivamente a dose de genes Hoxa13 e Hoxd11-Hoxd13 (este último discutido no post anterior, “Superexpressão do gene 13Hoxd: Mais pistas sobre a transição entre peixes e tetrápodes”) – que atuam na porção distal do membro em formação sobre um pano de fundo em que o gene Gli3 havia sido ‘deletado’ – levava a quadros de polidactilia progressivamente mais graves, ou seja, com maior número de dedos que por sua vez eram mais finos mais e densamente ‘empacotados’.

Abaixo podemos observar os fenótipos, associados aos esqueletos de camundongos recém-nascidos, que foram considerados os mais representativos das séries de alelos dos genes  Hoxa13; Hoxd11-13; Gli3 [o sinal de + indica a presença do alelo e o de – a sua ausência; e o Hoxd11-13 indica que ambos os loci são tratado e manipulados como um só].  Note que o número de dedos (indicados para a condição,  na base  da figura,  Gli3XtJ/XtJ) aumenta à medida que a dose de genes Hox distais é reduzida. Outro resultado importante é que quando resta apenas uma única cópia funcional de Hoxa13, como fica claro na coluna da direita, as pontas dos dedos passam a estar ligadas por faixas contínuas de tecido (ossificado, em vermelho, e cartilaginoso, em azul) beirando a extremidade distal dos membros, o que fica ainda mais visível com a remoção de cópias do gene Gli3.

Assim, conforme mais genes Hox são removidos de um membro em desenvolvimento de camundongo, sem que haja o gene Gli3, mais dedos são gerados o que é exatamente o que se espera em um modelo semelhante ao proposto por Alan Turing.

Para compreender melhor estes resultados, a equipe de pesquisadores combinou a análise experimental com modelagem computacional do processo de formação de padrão por um mecanismo de reação-difusão. De posse das duas abordagens, os pesquisadores concluíram que os seus resultados dão forte apoio a ideia que existe realmente um mecanismo do tipo do de Turing subjacente a formação do padrão intercalado que produz os dedos em que a dose dos genes Hox distais modula o período (ou o ‘comprimento de onda’) dos dedos.

 “Nosso estudo genético sugere que os genes Hox atuam como moduladores de um mecanismo de do tipo Turing, que foi posteriormente confirmado por testes matemáticos realizados por nossos colaboradores, Dr. James Sharpe e sua equipe”, acrescenta Marie Kmita, Diretor da Genética e unidade de desenvolvimento de pesquisa na IRCM. [Veja “What mechanism generates our fingers and toes?”]

Abaixo pode-se observar nas ​​três primeiras linhas os padrões de expressão do gene Sox9 com diferentes combinações de mutantes para as séries alélicas Hoxa13; Hoxd11-13; Gli3. Os autores, por meio da simulação, puderam replicar os fenótipos associados ao mutantes triplos podem ser replicados pelo modelo de Turing em que a diminuição do gradiente de PD utilizado para modular a onda está correlacionada com a dose reduzida Hox (khox).

Os autores também ressaltam que estes padrões, que assemelham-se muito ao padrões endoesqueletais das nadadeiras de peixes, sugerem que o estado pentadáctilo dos vertebrados tetrápodes deve ter evoluído por meio de modificações de um mecanismo do tipo do postulado por Turing que agia em nossos antepassados não tetrápodes mais antigos e que, por meio de modificações dos padrões de expressão dos genes e de seus produtos, alteraram a dinâmica das reações que resultaram em mudanças na formação, número e na distribuição dos elementos esqueletais mais distais:

Além disso, mostramos que reduzir drasticamente a dose dos genes Hox em camundongos transforma dedos em estruturas que lembram as extremidades das nadadeiras dos peixes. Essas descobertas também apoiar o papel fundamental dos genes Hox na transição de barbatanas para membros durante a evolução, uma das mais importantes inovações anatômicas associadas com a transição do meio aquático para a vida terrestre.” completa Kumita. [Veja “What mechanism generates our fingers and toes?”]

Estes resultados nos permitem postular uma relação entre a evolução dos membros dos vertebrados e o papel de mudanças nos genes Hox distais. Assim, como é mostrado na árvore filogenética de grupos de animais representativos, podemos perceber relações entre os padrões esqueléticos dos  apêndices (nadadeiras e membros) desses animais com a expressão correspondente dos genes Hox distais – e dos gradientes de Gli3R (‘Repressor Gli3’, resultado da proteólise da proteína Gli3, que tem função inibitória na transcrição) que estão representados quando conhecidos [o actinopterígio mostrado na figura é o peixe da espécie Polyodon spathula].

Notem bem que ao revogar a sinalização da via Shh e reduzir a função de genes Hox distais no membro autopode de camundongo (Hoxa13+/-; HoxdDel11-13/Del11-13; Gli3XtJ/XtJ) tem-se como resultado o aparecimento, nestes animais, de características de esqueleto que são compartilhadas com as do tecidos esqueléticos das nadadeiras peitorais de tubarões, como o Chiloscyllium punctatum, que exemplificam os condrictios, e de peixes ósseos com nadadeiras raiadas, como o Polypterus senegalus, representando os osteícitios, isto é elementos iterativos, numerosos e densamente empacotados com uma banda distal cartilaginosa correspondente aos arcos radiais distais das nadadeiras destes animais (vejam as setas):

“O padrão periódico de elementos esqueléticos evidentes em nadadeiras e membros mutantes sugere fortemente que um processo auto-organizado de condrogênese  baseado em um mecanismo tipo Turing seja profundamente conservado entre os vertebrados. Os resultados indicam ainda que a dose de genes Hox distal regula o número e o espaçamento dos elementos esqueléticos formados, implicando distais redes reguladoras de genes Hox como sendo impulsionadores críticos da evolução do membro pentadáctilos.” [Sheth R et al, 2012]

Este estudo, bem como o descrito no post anterior, nos mostra como hipóteses derivadas da análise comparativa de grupos de animais vivos e extintos, juntamente com insights advindos  genética do desenvolvimento, e de modelos teóricos de formação de padrões, podem ser colocadas a prova e avaliadas quanto a sua viabilidade e coerência com os dados por meios de engenhosos experimentos,  modelagem matemático-computacional e análise filogenética. Através deste tipo de investigação multidisciplinar, por meio da proposição e teste criterioso e criativo de  ideias como essas, é que vamos compreendendo mais e melhor como grupos de organismos puderam dar origem a outros e como novos órgãos, estruturas e sistemas surgiram e evoluíram ao longo do tempo em função de mutações que alteravam a forma com estes mecanismos ‘genéricos’ [De determinantes ‘genéricos’ aos ‘genéticos’: A importância da física nos primódios da evolução animal.] formadores de padrão operavam.

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Referências:

  • Vogel G. Developmental biology. Turing pattern fingered for digit formation. Science. 2012 Dec 14;338(6113):1406. doi: 10.1126/science.338.6113.1406. PubMed PMID: 23239707.

  • Sheth R, Marcon L, Bastida MF, Junco M, Quintana L, Dahn R, Kmita M, Sharpe J, Ros MA. Hox genes regulate digit patterning by controlling the wavelength of a Turing-type mechanism. Science. 2012 Dec 14;338(6113):1476-80. doi:10.1126/science.1226804. PubMed PMID: 23239739.

  • Kondo S, Miura T. Reaction-diffusion model as a framework for understanding biological pattern formation. Science. 2010 Sep 24;329(5999):1616-20. doi: 10.1126/science.1179047. Review. PubMed PMID: 20929839.

Creditos das Figuras:

MIKKEL JUUL JENSEN / SCIENCE PHOTO LIBRARY

Superexpressão do gene 13Hoxd: Mais pistas sobre a transição entre peixes e tetrápodes:

Os vários fósseis de formas de transição (aqueles mesmo que os criacionistas insistem não existir. Veja esta resposta de nosso tumblr) indicam que os membros dos vertebrados tetrápodes evoluíram a partir de nadadeiras por meio da elaboração seqüencial de porções distais do endoesqueleto. Estes processo de elaboração segundo os cientistas pode ter ocorrido por uma redução simultânea da prega distal ectodérmica das nadadeiras de peixes ancestrais, dos quais nós tetrápodes evoluímos. Uma das formas de se conseguir tal resultado seria através de alterações do controle da transcrição de genes do grupo Hoxd por meio de elementos cis-regulatórios (isto é, sequências de DNA não transcritas mas que ajudam a modular a expressão dos genes a que estão associada a partir da ligação de fatores de transcrição e repressoras) conhecidos como ‘reforçadores’ ou ‘acentuassomos‘ (enhancers) que seriam específicos para os dedos. Esta sugestão de mecanismo evolutivo específico para as transformações morfológicas foi testada recentemente através da indução de superexpressão de um desses genes do grupo do Hox no peixe-zebra (Danio rerio).

Abaixo podemos ver o cluster de genes Hoxd e seu papel no desenvolvimento dos membros de vertebrados tetrápodes. Em (a) temos a representação esquemática de parte do aglomerado Hoxd, mostrando o arranjo de seis dos nove genes Hoxd ao longo de um único cromossomo que são características dos genes do grupo Hox que mostram essas estreitas relações espaciais. Em (b) é mostrado o membro em desenvolvimento de um embrião de pinto em que podemos perceber que à medida que o broto do membro cresce, ele exibe um padrão dinâmico de sobreposição das expressão destes genes Hoxd, que se correlaciona com o arranjo espacial dos genes ao longo do cromossomo. Este padrão subdivide o membro em desenvolvimento em regiões que a partir daí produzirão estruturas distintas, como será o caso, por exemplo, de cada uma das três regiões no ápice do membro em desenvolvimento que darão origem aos três dedos vistos nas galinhas adultas.

Como mencionado, neste novo estudo conduzido pelos pesquisadores Renata Freitas, Carlos Gómez-Marín, Jonathan Mark Wilson, Fernando Casares, José Luis Gómez-Skarmet, intitulado “Hoxd13 Contribution to the Evolution of Vertebrate Appendages” (publicado no dia 11 de dezembro na revista Developmental Cell), foi constatado que a superespressão do gene 13Hoxda nas extremidades das nadadeiras em crescimento do peixe-zebra promove a proliferação celular, a expansão distal do tecido condrogénica e também a redução das pregas das nadadeiras.

 

O ponto importante aqui é que a redução dos pregas das nadadeiras e a geração de novo tecido cartilaginoso, recapitulam aspectos chaves do desenvolvimento embriológico dos tetrápodes terrestres. Mas os pesquisadores não ficaram apenas nisso. Eles também foram capazes de mostrar que um elemento reforçador específico de tetrápodes (CsC), associado a expressão de genes 5′ Hoxd, induz padrões de expressão similares nas nadadeiras dos peixes-zebra estudados àqueles observados em membros de camundongos.

“Nós descobrimos que no peixe-zebra, o elemento do camundongo de controle do gene Hoxd13 era capaz de dirigir a expressão do gene no rudimento distal da nadadeira. Este resultado indica que as máquinas moleculares capazes de ativar este elemento de controle também estavam presentes no último ancestral comum entre os animais com nadadeiras e patas e está provado por seus vestígios no peixe-zebra,” como diz o Casares, outro dos autores do estudo. [via Eurekalert]

Ao lado podemos observar um embrião do peixe-zebra que, após ter sido geneticamente manipulado – de modo a produzir a proteína HoxD13 no interior das células que ficam na ponta do tecido que dá origem a nadadeira em desenvolvimento -, desenvolveu um membro que se parece mais com uma pata do que com uma nadadeira/aleta [Crédito: Freitas et al., 2012 Developmental Cell doi:10.1016/j.devcel.2012.10.015].

Na figura ao lado e à direita  que é uma tradução do resumo gráfico (que está diponível online no site da Cell Press com o resumo do artigo), podemos ver melhor todo o raciocínio por trás da hipótese e como o experimento lhe dá apoio, já que o aumento da produção do gene 13Hoxda obtido por aumento das regiões reforçadoras induz no peixe-zebra mudanças similares as sofridas pelos brotos dos membros em desenvolvimento dos vertebrados tetrápode. Note que a cor azul indica as regiões proliferativas. 

Assim, de acordo como os autores do artigo, estes resultados conferem apoio a idéia de que a modulação da expressão de genes 5’Hoxd, obtida por meio da aquisição de novos elementos reforçadores, serviram como o substrato para a evolução das nadadeiras e por conseguinte tendo sido cruciais na origem dos membros autopodes dos tetrápodes.

 

Porém, estes resultados são importantes por vários motivos mais gerais, dos quais podemos citar dois: Em primeiro lugar esta descoberta é mais uma evidência para a ideia geral que a evolução morfológica depende muito de mutações nos elementos cis-regulatórios, aqueles que estão envolvidos na especificação de quando e onde os genes serão expressos, bem como as quantidades dos produtos gênicos que serão produzidas. Nas palavras de José Luis Gómez-Skarmeta, autor sênior do estudo, pesquisador do CSIC-Universidad Pablo de Olavide-Junta de Andalucía, em Sevilha , Espanha:

“Primeiro, e acima de tudo, esta descoberta nos ajuda a entender o poder que a modificação da expressão gênica tem em moldar nossos corpos,” [via Eurekalert]

Mas, além disso, como também ressalta Gómez-Skarmeta, este trabalho tem implicações diretas na saúde humana:

“Segundo, muitas doenças genéticas estão associadas a uma má formação dos nossos órgãos durante o desenvolvimento. No caso dos genes envolvidos na formação de membros, a sua função anormal está associada com doenças tais como sinpolidactilía e a síndorme mão-pé-genital [via Eurekalert]

Estes comentários ilustram a abrangência e as diversas implicações da pesquisa em biologia evolutiva do desenvolvimento e em ciência básica de modo geral, deixando claro como mesmo os ramos mais fundamentais da pesquisa científica podem nos ajudar com problemas mais práticos. Além disso, este trabalho como um todo mostra a biologia evolutiva no seu melhor, isto é, ele exemplifica como a junção de informações obtidas a partir da análise dos fósseis com as adquiridas por meio de estudos comparativos experimentais permitem que resolvamos questões complicadas sobre a história da vida em nosso planeta que vão sendo investigadas usando-se múltiplas ferramentas e várias estratégias e linhas de investigação complementares.

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Referências:

  • Freitas, Renata, Gómez-Marín, Carlos, Mark Wilson, Jonathan, Casares, Fernando, Gómez-Skarmeta,José Luis. Hoxd13 Contribution to the Evolution of Vertebrate Appendages. Developmental Cell, 2012; 23 (6): 1219 DOI: 10.1016/j.devcel.2012.10.015

 

Créditos das Figuras:

Esquema altamente idealizado de um reforçador sem menção a cromatina (Data:
12 de abril fr 2008; Autor: Squidonius) – wikicommons     

Figura 2 AcessScience RESEARCH UPDATE: Evolutionary developmental biology (vertebrate)

 

Conheça os fósseis dos primeiros animais com ‘esqueleto’ (via Revista FAPESP)

Interessante vídeo, com o paleontólogo Lucas Warren, sobre as recentes descobertas de fósseis de animais com carapaças mineralizadas em um sítio fossilífero localizado nos arredores do pequeno povoado de Puerto Vallemí, no Paraguai, e que datam do pre-cambriano. Estes fósseis podem nos ajudar a compreender melhor o que ocorreu durante a explosão cambriana e especialmente o que pode tê-la ‘detonado’. Veja também nosso post “A Explosão Cambriana: Uma introdução

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Referências:

  • ZORZETTO, A vida protegida por armaduras Edição 199, Setembro de 2012

  • WARREN, L.V. et al. The dawn of animal skeletogenesis: Ultrastructural analysis of the Ediacaran metazoan Corumbella werneri. Geology. v. 40. p. 691-94. ago. 2012.

  • WARREN, L.V. et al. Corumbella and in situ Cloudina in association with thrombolites in the Ediacaran Itapucumi Group, Paraguay. Terra Nova. v. 23 (6), p. 382-89. dec. 2011.

Um Darwin Diferente: A Vida Amorosa

Quando jovem  Darwin foi um rapaz gastador e com um forte espírito aventureiro. Nem mesmo as tentações conseguiram desviá-lo de seus propósitos. Foto de uma antiga moeda britânica de duas libras (cerca de R$6), com Charles Darwin. Muito rara hoje em dia e vale bastante para colecionadores, devido não ser mais fabricada.

Em outra postagem de mesmo título procurei apresentar um Darwin diferente do que estamos acostumados a admirar ou criticar nos textos sobre evolução das espécies. A proposta aqui é mostrar o ser humano por trás do intrépido naturalista que saiu pelo mundo numa viagem de circunavegação como propósito de embasar as sua teorias sobre a origem e evolução das espécies.

Na sua juventude, Charles Darwin (1809-1882) foi um rapaz gastador, tinha uma verdadeira compulsão por   consumir e, certa vez em uma de suas cartas endereçadas às suas irmãs, disse “que era capaz de gastar dinheiro até na Lua”. Aliás, as correspondências de Darwin  serviram para revelar muito sobre a personalidade oculta do naturalista. Uma carta que Darwin escreveu a seu amigo, o geólogo escocês Charles Lyell, em 1861, pouco mais de um ano após a publicação de A Origem das Espécies mostra, por exemplo,  um Darwin que parece estar num dia de fúria . A missiva, encontrado em A Correspondência de Charles Darwin, Volume 9  e disponibilizado on-line pelo Projeto Correspondência de Darwin , é ao mesmo tempo chocante em seu desânimo incomum e estranhamente reconfortante, lembrando-nos que mesmo as maiores mentes também têm os seus dias negros. Diz Darwin na carta, em um certo momento:

” Mas eu estou muito mal hoje e muito estúpido e odeio todo mundo e tudo…” 

Apesar desta pequena amostra de destempero, Darwin tinha amigos em toda a parte, até no Brasil. O naturalista alemão Fritz Müller, que residiu por 20 anos em Blumenau, Santa Catarina trocou vasta correspondência com seu ídolo britânico. Após ler de modo entusiasmado “A Origem das Espécies”, Müller publicou em 1863 o seu primeiro livro, intitulado Für Darwin, uma reunião de fatos e argumentos que apoiavam a Teoria da Evolução. Eram tão ligados que o próprio Darwin pedia, por carta, que ele pesquisasse certos aspectos práticos de suas teorias e Müller fazia isso de bom grado.

Mas vamos agora nos concentrar na vida amorosa de Darwin. Desde a infância ele nutria uma paixão por sua amiga e vizinha Fanny Owen (1808-1891). Fanny  era considerada a garota mais formosa da cidade e do condado, era muito cortejada e, a julgar por suas cartas, muito inquieta.  Antes que ele viajasse, a jovem lhe pedira em carta que, qualquer que fosse seu título, não deixasse de visitá-la e de manter acesa sua amizade.

A vida em Cambridge certamente tinha afastado Fanny de Darwin. Um jardim – chamado “floresta” e mencionado posteriormente nas cartas de Fanny como “Floresta Negra” – que ocupava a fronteira das duas casas, tinha sido palco de namoricos na infância e na adolescência, além do estúdio na casa dela, lembrado por anos em cartas secretas como tendo sido o cenário de muitas descobertas, tanto que se referiam a esses locais  com um misto de encanto e sedução.

Contudo, em 1830 Fanny ficaria noiva de Jonh Hill,  um clérigo americano, irmão do deputado conservador da cidade. Certa vez Darwin  recebeu dela uma pequena bolsa de presente com um bilhete enigmático: “Dr. Postilhão, aceite esta pequena bolsa como lembrança da governanta da Floresta Negra”. Os postilhões eram homem muito atraentes, andavam uniformizados e traziam um chicote à cintura, denotando o seu caráter dominador. As moças  das classes mais elevadas se vestiam como se vestem hoje as governantas, com touca e avental. Anos antes, Hill terminara o noivado com Fanny e ela, pelo teor de seu bilhete, claramente estava disposta a voltar a brincar no jardim que dividia as duas casas; Charles como o imponente postilhão e ela a submissa governanta.

Fanny parecia conhecer muito bem a timidez de Darwin, seu jeito nervoso que o levava a gaguejar e a necessidade de dar um “empurrãozinho’ no rapaz para terminar uma frase tola ou para começar algo mais sério. Embora não fosse comum para a época, Fanny tinha compartilhado com Darwin hábitos tão extravagantes para uma moça como o tiro e o jogo de bilhar.

Até alguns dias antes  do Beagle partir no final de 1832, Fanny tentou fazê-lo desistir de sua viagem. Sua beleza elogiada por tantos quantos a conheciam, não podia suportar a insensibilidade de Charles diante do conteúdo de suas cartas, ora açucaradas, ora picantes. Nem as lembranças  dos bons momentos que tinham passados juntos impediram o jovem naturalista de partir em buscas de seus anseios.

Quando retorna de sua viagem  em 1836, Darwin se apaixona  por sua prima Emma Wedgwood e casa-se com ela em janeiro de 1839. Sua esposa bela e doce, com quem teve 10 filhos, o amparou na doença que o acometeu durante toda a vida até o leito de morte, 43 anos depois. Durante esse período, Emma acompanhou o marido dividindo a tristeza da perda precoce de 3 filhos, mantendo a sua religiosidade e auxiliando-o  na escrita de obras das quais era crítica.

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Para saber mais:

Inscrições para o Festival do Minuto: O tema é a ciência!

A pedido da produtora do ‘festival do minuto‘, Viviane Carvalho, replicamos o texto que divulga o tema do festival deste ano que, não por acaso, é a ciência.

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  Ciência é novo tema de concurso do Festival do Minuto

 Participantes concorrem a seis laptops como prêmios

 O concurso tem apoio da FAPESP e as inscrições vão até o dia 30 de outubro

 

Ciência. É só pensar no termo que já vem à cabeça um laboratório, um rato para experiências e um cientista maluco de avental branco? Pois ciência é muito mais do que essa visão estereotipada, já que nos deparamos com ela nas mínimas coisas do dia a dia – da lâmpada elétrica ao telefone celular, do banho quente aos tratamentos de saúde, da conservação ambiental ao uso da internet. Por isso, o termo pode trazer inúmeras ideias para criar belos vídeos de um minuto. É no que aposta o novo concurso do Festival do Minuto. 

Mas, afinal, o que é ciência? Mesmo que sua definição seja bastante abrangente, podemos dizer que ciência é o resultado do esforço humano para aumentar o que se sabe sobre determinado assunto com base em um método científico, ou seja, na observação, no questionamento e no raciocínio lógico. É desse conhecimento que resultam boa parte das descobertas e das invenções. Em resumo, ciência também é resultado da nossa criatividade.

Por isso, para participar do festival, nada melhor do que deixar a imaginação fluir sobre qualquer ciência, seja ela exata, humana ou sobre a vida. Ciência da computação, engenharia, física, matemática, química, zootecnia, botânica, biologia, antropologia… E, como sempre, valem vídeos de 60 segundos em qualquer formato: filmes de animação, vídeos feitos com câmeras digitais, celular, ipad etc. O que vale, mais uma vez, é a criatividade. O concurso segue aberto a pessoas de todas as idades, com inscrições até o dia 30 de outubro.

 

FAPESP: 50 anos de apoio à pesquisa

A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) é uma das mais importantes agências brasileiras de apoio à pesquisa científica. Criada em 1962, a FAPESP, ao longo dos seus 50 anos, concedeu cerca de 105 mil bolsas de pesquisa – da graduação ao pós-doutorado – e apoio a mais de 92 mil auxílios para pesquisadores do Estado de São Paulo. O apoio é dado a pesquisas em todas as áreas das ciências, bem como tecnologia, engenharia, artes e humanidades. A FAPESP também apoia pesquisas em áreas consideradas estratégicas para o País, por meio de programas em grandes temas, como biodiversidade, mudanças climáticas e bioenergia.

Para saber mais, acesse www.fapesp.br.

 

Sobre o Festival do Minuto

O Festival do Minuto foi criado no Brasil, em 1991, e propõe a produção de vídeos com até um minuto de duração. É, hoje, o maior festival de vídeos da América Latina e também o mais democrático, já que aceita contribuições de amadores e profissionais, indistintamente. A partir do evento brasileiro, o Festival do Minuto se espalhou para mais de 50 países, cada um com dinâmica e formato próprios. O acervo do Minuto inclui vídeos de inúmeros realizadores que hoje são conhecidos pela produção de longas-metragens, como os diretores Fernando Meirelles (Cidade de DeusO Jardineiro Fiel), Beto Brant (O Invasor, Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios) e Tata Amaral (Um Céu de EstrelasAntônia).

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Esperamos que os leitores do evolucionismo.org participem, quem sabem fazendo um vídeo sobre evolução que poderemos divulgar aqui também. 🙂

ORIGEM DA VIDA: RECENTES CONTRIBUIÇÕES PARA UM MODELO CIENTÍFICO (de Hernâni L.S.. Maia e Ilda V. R. Dias)

Outro interessante acréscimo ao acervo de livros de divulgação cientifica publicados no Brasil. Desta vez o tema versa sobre as origens da vida e as hipóteses, modelos e teorias científicas que têm sido propostas e investigadas para explicar este grande e excitante mistério. O livro é ‘Origem da Vida: Recentes Contribuições para um Modelo Científico‘ editado este ano pela editora da livraria da Física a partir da edição original portuguesa da editora escolar que havia saído em Portugal em 2008.

O livro é escrito pelo químico orgânico, Hernâni L.S. Maia, especializado em peptídeos, professor do Departamento de química da Universidade do Minho, em Portugal e por Ilda V.R. Dias sobre a qual, infelizmente, não consegui achar mais informações. O livro aborda um amplo conjunto de tópicos relacionados a origem da vida, em seus primeiros capítulos, contextualizando historicamente a questão e discutindo sua ligação com os debates entre o século XVII ao XIX, bem como em relação a emergência da teoria da evolução que surgia como uma contrapartida científica a visão criacionista ainda preponderante no século passado. Pretendo em breve, assim que terminar a leitura do livro, fazer uma resenha mais extensa e discutir alguns de seus capítulos e temas mais importantes.

O livro, além das edições portuguesa e brasileira, também está disponível em uma edição online livre, em inglês, na qual consta mais um autor, Keith G. Orrell, do Departamento de Química da Universidade de Exeter. Porém recomendo a compra da versão impressa, especialmente como forma de valorizar a publicação deste tipo de material em nosso idioma, mas procurem por promoções, pois o livro não está exatamente barato, custando por volta de R$60,00.

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Referências:

  • Maia, Hernâni L.S. & Dias, Ilda V.R. Origem da Vida: Recentes Contribuições para um Modelo Científico, Escolar Livraria da Física, 1a ed., 2012, 286 páginas

  • Dias, Ilda V.R. & Maia, Hernâni L.S. Origem da Vida: Recentes Contribuições para um Modelo Científico, Escolar Editora, Lisbon, 2008