A Estabilidade do Paradigma Darwiniano

Passados mais de 150 anos desde a publicação da primeira edição de ‘A Origem das Espécies’, a teoria proposta pelo naturalista Charles Darwin (e por Alfred Russel Wallace) ainda permanece ilesa e fortificada apesar das inúmeras tentativas de refutação a que foi submetida ao longo do tempo. De acordo com o médico psiquiatra, antropólogo e professor universitário português António Bracinha Vieira, a teoria de Darwin:

conseguiu algo extraordinário e único no mundo científico: ao longo de um século e meio foi englobando, sintetizando e dando sentido a outras teorias, hipóteses explicativas e modelos dispersos pelo espaço imenso das ciências naturais que vão da geobiologia à biologia molecular.” (Vieira, 2009, p.11)

A solidez do chamado paradigma darwiniano, produzido nos anos 1940 durante a síntese evolucionista, sempre foi proclamada e sustentada com afinco pelo biólogo, nascido na Alemanha (naturalizado e radicado nos EUA), Ernest Mayr (1904-2005). Segundo Mayr, os princípios básicos do darwinismo estão mais firmemente estabelecidos do que nunca, posto que hoje é um programa de pesquisa altamente complexo, que está a ser constantemente modificado e aperfeiçoado. Em seu livro “Biologia, Ciência Única” (Mayr, 2005), Mayr, um dos responsáveis pela moderna síntese evolucionista, reafirma a validade da teoria da evolução de Darwin e explica que ela é composta de cinco teorias separadas, cada uma com sua própria história, trajetória e impacto. Em um determinado trecho deste livro, o biólogo evolucionista dispara:

… produto da síntese das teorias dos estudiosos da anagênese e da cladogênese, foi chamada de teoria sintética da evolução. Na realidade, a melhor solução seria chamá-la, simplesmente, de darwinismo. Com efeito, trata-se, em essência, da teoria original de Darwin com uma teoria válida de especiação e sem a hereditariedade leve. Como essa forma de hereditariedade foi refutada mais de cem anos atrás, não pode haver equívoco na retomada do simples termo “darwinismo”, porque ele engloba os aspectos essenciais do conceito original de Darwin. Em particular, refere-se a inter-relação entre variação e seleção, o cerne do paradigma de Darwin, e confirma que é melhor se referir ao paradigma evolucionista, após um longo período de maturação, simplesmente como darwinismo. (Mayr, 2005).

Não se pode falar em paradigma sem mencionar o físico e filósofo da ciência Thomas Kuhn (1922-1996). De acordo com o enfoque historicista de Kuhn, a ciência desenvolve-se segundo determinadas fases, a saber: estabelecimento de um paradigma, ciência normal, crise, ciência extraordinária, revolução científica e estabelecimento de um novo paradigma. Como é explicado no verbete da wikipédia sobre o filósofo:

A noção de paradigma resulta fundamental neste enfoque historicista e não é mais que uma macroteoria, um marco ou perspectiva que se aceita de forma geral por toda a comunidade científica […] e a partir do qual se realiza a atividade científica, cujo objetivo é esclarecer as possíveis falhas do paradigma ou extrair dele todas as suas consequências.” [Thomas Kuhn]

No livro “‘Estruturas das Revoluções Científicas’, Kuhn esclareceria posteriormente que o termo pode ser utilizado num sentido geral e num sentido restrito. O primeiro diz respeito à noção de matriz disciplinar, que é o “conjunto de compromissos de pesquisa de uma comunidade científica.O segundo sentido denota os paradigmas exemplares, que são a base da formação científica, uma vez que o pesquisador passa a dominar o conteúdo cognitivo da ciência através da experimentação dos exemplos compartilhados.” [Thomas Kuhn]

No caso do darwinismo, não houve nem rompimento nem incomensurabilidade no sentido de Kuhn e sim um esclarecimento, pela mesma “matriz disciplinar”, de uma imensa constelação de fenômenos, conforme assinala Vieira (2009) em seu livro. Para o referido autor, o darwinismo no seu estado atual, permite a integração de tantos e tão sólidos dados e conceitos que unifica e dá coerência ao imenso espaço heurístico interposto entre a geobiologia e a biologia molecular. Vieira conclui afirmando que, após a grande síntese, a biologia adquiriu autonomia plena e se tornou uma ciência exemplar, integrada em torno de uma teoria central unificadora capaz de dirigir e aprofundar a investigação em todas as frentes (Vieira, 2009).

———————

Referências:

  • Vieira, António Bracinha A Evolução do Darwinismo, Ed. Vieira & Lent, Rio de Janeiro, 2009, p.11

  • Mayr, Ernest Biologia, Ciência Única “Ed. Companhia das Letras, 2005, 272 p.

  • Thomas Kuhn In: Wikipédia: a enciclopédia livre. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Thomas_Kuhn>; Acesso em:  9 jan 2017.

Leia também

Um comentário

  • Jonas Gama Martins 29 de novembro de 2013  

    Muito bom Rodrigo….bom trabalho meu caro…Rodrigo, meu campo de leitura e mais atuante em genética, caso tenha algo relacionado, gostaria de receber ou compartilhar! Abraço

Deixe um comentário